domingo, 31 de maio de 2009

Registro 269: Relato de uma semana que se finda

A semana que se finda foi movimentada. Fazer um relato sobre ela é dar conta de coisas que acontecem e que me põe em movimento ou não. Depende do que rola ou do meu jeito de encarar cada situação. Mas vamos num giro sobre a semana soteroplitana.
O clima em Salvador continua ameno e isso, pra mim, é uma benção. Pena que as chuvas desabriguem tantos com tão pouco. Não suporto o calor, uma coisa nada civilizada. Caso me pergunte por que eu estou em Salvador, terra de tanto calor, digo que tem coisas por aqui de que gosto muito. Mas não gosto dessa tal de "baianidade", tema de uma mesa coordenada pelo professor e ator e diretor Celso Júnior. A tal mesa aconteceu no V ENECULT, evento que discute a cultura. No seu blog Cadernos Grampeados, Celso faz um reflexão sobre cultura ou falta dela, baianidade e arte. Vale uma olhada. Você pode não gostar, mas tem humor por lá e muita seriedade no que ele pensa.
Também participei de uma mesa coordenada pela professora Antônia Pereira (PPGAC - UFBA), juntamente com as professoras Cássia Lopes e Cleise Mendes também do referido programa. Fui bendito entre as mulheres. Nosso tema era corpo e teatralidade na contracultura. Foi uma boa mostra e sinaliza para o tema - contracultura - que a meu ver é sempre olhado de esgueira, como aquela onda desbundada. Diante do que vejo por aí, fecho com o desbunde. A sala estava cheia, pena que não pudemos debater entre nós nem com os participantes. E olha que cumprimos o tempo destinado a cada comunicação. Ás vezes me ocorre que tais encontros, importantíssimos, são pensados para a ser assim mesmo: sem tempo.
Conheci a diretora Fran Teixeira, cearense de boa cepa, artista talentosa. Quem viu O Cantil que ela trouxe para o FIAC - Bahia (2008), sabe do que falo. A dramaturgia, direção e produção do espetáculo sob sua responsabilidade anima o espectador que anda reticente com o teatro. Eu ando assim. Por isso não saio de casa pra ver qualquer coisa. O Cantil uma leitura muito precisa de A Exceção e a Regra de Bertolt Brecht é inesquecível. Por falar em teatro bom, gostei de ver Alegria de Viver de Déborah Moreira e George Mascarenhas. Transitando pelo mito de Pigmalião, cruzando-o com o universo de Matisse, os dois artistas tocam nossos corações. Digo por mim que saí do teatro com vontade de fazer teatro. A vontade passou, mas não o desejo de voltar e ver novamente a criação desse dois sensíveis intérpretes. Eles lidam muito bem com a Mímica Corporal Dramática.
Na quinta-feira, 28, ainda como parte do ENECULT, houve lançamento de livros editados pela Edufba, entre eles, Transas na Cena em Transe: teatro e contracultura na Bahia, de minha autoria. O evento foi no belíssimo Palacete das Artes, um dos exemplares que restou da arquitetura do início do século XX em Salvador, datada de 1912. Poucos amigos estivarem por lá, mas os que compareceram animaram a minha noite e aqueceram meu coração. Ah, tinha uma gente metida, fazendo pose. Nariz em pé não faltava. Nessa ocasiões medito sobre a vaidade. Por vezes me sinto que nem aquele Poema em Linha Reta - Fernando Pessoa-Álvaro de Campos. Quando deu certa hora e achei que tinha cumprido o meu papel de autor, saí à francesa. Tenho dois livros publicado pela Edufba: Abertura Para Outra Cena: o moderno teatro na Bahia (2006), é anterior a Transas na Cena em Transe. O primeiro, trata sobre a criação da Escola de Teatro em 1956 e analisa o projeto de Martim Gonçalves. O segundo livro retoma outro momento da história do teatro na Bahia. Outro dia um aluno me chamou de "referência". Rimos muito. É, parece que virei referência sobre o assunto. Ah, ia me esquecendo, fui entrevistado por uma aluna da Escola de Teatro sobre o XVI Curso Livre de Teatro, quando dei aulas e dirigi Píramo e Tísbe, de Vladimir Capella, um autor de teatro para criaças que a Bahia precisa descobrir. Ele é dos ótimos.
A semana foi também de muitas reuniões e expectativas: a Faculdade Social, onde sou docente e cooordenador do curso de Artes Cênicas, recebeu a comissão do MEC que veio para avaliar a instituição, em função do seu recredenciamento. Acho que nos saímos bem. Vamos aguardar o resultado. Por falar no curso de Artes Cênicas, preparamos o Seminário Interdisciplinar 2009.1, um momento muito interessante no processo artístico-pedagógico.
Recebi uma mensagem de Marcos Barbosa, dramaturgo e professor de mão cheia. O motivo da mensagem foi a leitura que ele fez de meu livro Sob o Signo das Luzes. Ah, os livros, os temas, os interesses nos ligam.
Ah, comprei livros. Compro livro na mesma medida que compro comida. Meu corpo também se alimenta de palavras. A minha mesa de cabeceira tem uma pequena pilha de coisas para ler. Devorei O Filho da Mãe, de Bernardo Carvalho. Gostei imensamente. Ao terminá-lo, recomecei a leitura, de tão bom que é o livro.
Assombrei-me com a ameaça da explosão nuclear da Coreia do Norte. Ditadores são sempre insanos. Eles são guiados pela razão louca. Durma-se com uma ameaça dessa!
Na República Sindicalista - o Brasil - um acontecimento me deixa sem entender a jogada, embora as "otoridades" tenham explicado. Falo sobre o apoio dado pelo governo brasileiro ao ministro da cultura do Egito, candidato ao maior cargo da UNESCO. Não desceu, estou entalado. Acho bacana a aproximação com os países árabes, mas apoiar o tal ministro... Ah, e tem um brasileiro credenciado para tal função, já atuando na UNESCO. Ele é preterido pelo seu próprio país e dizem que o homem é competente. Dá saudade de Stanislau Ponte Preta.
Pra encerrar, fui ver o coral da Igreja de Santana do Rio Vermelho regido por Giancarlo Salvagani. Eles cantaram uma Ave Maria em russo, muita linda e bem executada. Encerraram a missa com o Magnificat. Era uma cerimônia para coroar Maria. Meninas vestidas de anjo, meninos com velas formando uma corredor até o altar, mas tudo sem ritmo, sem noção de ritual muito menos de espetáculo. Deu vontade de meter o dedo e dizer como é que se faz uma cerimônia de coroação. Mania de gente de teatro, assumo. "A gente nasce para o que é". Êta sabedoria!
Ufa!

terça-feira, 26 de maio de 2009

Registro 268: Depoimento VII

O jornal O Estado de S. Paulo em seu Caderno 2 - Cultura - sempre aos domingos - apresenta um espaço denominado Antologia Pessoal, no qual profissionais das artes dão o seu depoimento sobre assuntos de sua área. As perguntas não variam, são sempre as mesmas. Ao apropriar-me da idéia, acrescentei uma pergunta e reformulei algumas; basicamente são as mesmas do jornal.Assim, convido artistas baianos ou residentes em Salvador para deixar o seu depoimento no blog Cenadiária. Cada participante indicará um artista para que se forme uma rede de registros e opiniões. Semanalmente, a Cenadiária vai trazer uma personalidade do teatro baiano para o deleito do leitor. Divirta-se.

Sergipano de nascimento, desde jovem Harido Déda "sentou praça" na Cidade da Bahia. Ator, diretor teatral, mestre em Arte Cênicas, professor da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia. Participante do Centro Popular de Cultura - CPC, fundador do Teatro de Arena na Bahia, Harildo Déda tem em seu vasto currículo uma série de espetáculos, filmes e participações em novelas e mini-séries. Nos anos setenta ingressa no Teatro Livre da Bahia trabalhando sob a direção de João Augusto.

1 – Que atores ou atrizes cujo trabalho em teatro você acompanha?

Yumara Rodrigues

2 – Que atores ou atrizes de cinema compõem a sua galeria de favoritos?

Marlon Brando, Paul Newman, Pacino, Meryl Streep, Bette Davis.

3 – Qual diretor de teatro cujo trabalho faz você retornar ao teatro?

Marfuz, Paulo Dourado, Guerreiro e, é claro, Hackler.

4 – Dê exemplo de um criador teatral muito bom, mas injustiçado.

Todos que eu conheço são muito bons e injustiçados

5 – Cite uma criação teatral surpreendente e pela qual você não dava nada.
Eu, Brecht, de Deolindo Checcucci

6 – A cena baiano-brasileira tem alguns momentos teatrais antológicos. Cite algumas que marcaram sua vida.
O Bonde Chamado Desejo, direção de Charles Mac Gaw, Morte e Vida Severina, direção de Luiz Carlos Maciel, Stopem, Stopem e Os Cordéis, de João Augusto

7 – Que encenação lhe fez mal, de tão perturbadora?
Roda Viva, de Zé Celso

8 – Que espetáculo teatral mais o fez pensar?
As Três Irmãs, direção de Enrique Diaz, Hamlet (W. Moura - Aderbal)

9 – Comédia é um gênero de segunda?
Não!!! Mas muita gente que faz acha!

10 – Cite uma peça difícil, mas significativa.
Heda Gabler

11 – Cite uma encenação que imagina ter sido memorável e você não viu.
As Três Irmãs, direção de Gianni Ratto, Calígula, direção de Martim Gonçalves, com Sérgio Cardoso

12 – Uma encenação difícil, mas inesquecível.
A Casa de Bernarda Alba, direção de Possi

13 – Que texto(s) escrito(s) nos últimos dez anos merecia um lugar na história do teatro brasileiro?
E tem? Me lembre pelo amor de Deus!

14 – Qual o texto dramático clássico brasileiro, de qualquer tempo, você recomendaria encenações constantes?
Rasga Coração, Eles Não Usam Bleque-Tai, O Noviço, Álbum de Família, Vestido de Noiva

15 – Cite um(a) autor(a) sempre ausente dos cânones que merece seu aplauso?
...

18 – Que montagem (ou ator, autor, diretor, cenógrafo, figurinista, iluminador) festejado pela crítica você detestou?
Não sei.

19 – E que montagem (ou ator, diretor, autor) demolida por críticos você gostou?
As que eu vi na Bahia? Todas!...

20 – Qual peça e personagem gostaria de fazer? Você pode escolher três.
Qualquer Shakespeare, Em Família de Oduvaldo Vianna Filho, Gata em Teto de Zinco Quente.

21 – Que virtude você mais preza no teatro de qualidade?
A síntese.

22 – O que mais incomoda você no mau teatro?
A empáfia; o pretexto.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Registro 257: Flávio Império

Arquiteto, professor, artista plástico, diretor, produtor e cenógrafo, Flávio Império dedicou sua vida ao fazer teatral, participando de experiências consagradas e inovadoras do teatro brasileiro, como as do Arena e do Oficina, além de contribuir com seu talento para inúmeros espetáculos fora dos dois grupos magistrais.
Pelo seu trabalho recebeu quase vinte prêmios, como o Governador do Estado, Saci, Molière, Associação Paulista de Críticos de Arte, Medalha de Ouro na Bienal de Teatro e Prêmio de Cenografia na Quadrienal de Praga.
Flávio Império amadureceu como artista que entende a estrutura da linguagem teatral como totalidade. Para ele, cenografia não é fundo e roupa. É muito mais. É o momento do acontecimento teatral, incluindo a ação dramática, texto, luz, som, movimento e o público.
Conheci Flávio em 1976 depois que ele retornou de um verão na Bahia. Hóspede de José Possi Neto na Boca do Rio, Flávio soube por Possi da minha pessoa: uma jovem ator residindo em São Paulo, em começo de carreira. Certo dia, o porteiro do edifício anunciou a sua chegada para uma visita. E eu que admirava seus trabalhos, mas não o conhecia pessoalmente, tratei de recebê-lo ainda sob o impacto da surpresa.
Ao abrir a porta percebi de cara a força da presença. Sem muitos rodeios ele entrou sorrindo abertamente e com uma certa ironia disse estar ali para conhecer um ator baiano de quem tinha ouvido falar muito. Encabulei.
Ele relatou a estada em Salvador. Contou sobre a praia da Boca do Rio, sobre o Carnaval e sobre a perda da carteira surrupiada em meio a folia. De cara, me deu uma de suas gravuras impressa em acetato. No centro da gravura a imagem de um homem, que depois vim a saber quem era. Um homem nu em meio as formas orgânicas, destacando-se uma frase escrita numa espiral. Não lembro do texto; a gravura se perdeu entre as arribações. Mas a frase inicial dizia: "Tens algo das plantas, tens algo dos animais..." A partir daí tornei-me amigo e admirador desse artista, para quem Gianni Ratto dedicou o seu livro Antitratado de Cenografia. Em um país de significativos cenógrafos, Ratto também um importante artista da cenografia escolheu Flávio e Tomás Santa Rosa para homenageá-los. Transcrevo um trecho do livro:
É inevitável, observando panoramicamente a obra de Flávio, pensar nos grandes artífices da Renascença: homens-artistas-artesãos que dominavam um leque de atividades complexas cuja dimensão era a resultante de um esplêndido instinto criador aliado a uma intuitiva postura crítica (RATTO, 2001, p. 17).
Muito se escreveu sobre Flávio e ele deixou muitos escritos ainda sem publicação, mas um livro fundamental foi publicado pela Edusp: Flávio Império, organizado por Renina Kataz e Amélia Hamburguer.
Os textos e as reproduções dos quadros que se seguem são de autoria do cenógrafo inventor.
O teatro me ensinou a vida;
A arquitetura o espaço.
O ensino sinceridade.
A pintura a solidão.
O teatro me fez amigo da multidão.

Auto-retrato/detalhe.Técnica mista. Coleção particular. 1976

adoro
irmã/mente
noel e shakespeare, boal, zé celso, ruth, sábato; gente que faz acontecer o teatro no Brasil. caetano, bethania, célia, célia helena, cacilda, walmor, andré - sei lá
gente que sempre gostou de atuar na cena. mesmo que não soubessem exatamente o que estavam fazendo
GOSTAM e GOSTAVAM
quem se enche o saco se afasta e é sempre pouco, o que consegue nos afastar.
o comodismo, o dinheiro, a idade, a preguiça, - outras bossas.
uma certa "bohemia", cada geração no seu botequim - bar - restaurante, ou própria casa - vendo televisão.
e todo mundo hoje em dia claro que prefere receber em dollares, como a Carmem Miranda!
o "artista" precisa de muita conversa tanto quanto de muito silêncio e recolhimento interior pra conseguir criar.
só na correria, não dá!
e sossego é dólar, ou relativa pobreza.
agradeço a todos os que até hoje me aplaudiram.
porque GOSTARAM.
e se gostam eu também fico contente de conseguir "fazer" o próprio "ato" de agradar.
"gostar da gente" é o nosso IBOPE pessoal
não tenho unanimidade. (mas isso, nem Cristo) mas uma deliciosa platéia,
quando é Bethania, Gal, Artigas, Caetano, Walmor, Célia, Edmar, Gláucia, Vina, Azzis, Guarnieri, Paulo José, Tozzi, Carmela, Djalma, Dina, Myriam, Flávio Motta, Renina, Parreiras, e quantos foram os aplausos.
tive de "agradecer" na estréia de Andorra. fui levado pelo próprio chamado
foi incrível
e, basta uma vez na vida.
é uma enorme prova de amor alegre e cheio de lágrimas foi tão grande o sentimento, que até hoje agradeço.
se me perguntassem algum desses dias com quem mais gostaria de trabalhar
eu reponderia ARRIGO e CASÉ
há sempre com quem, imagine ter feito a "cenografia" de algum show da Ângela Maria, Procópio, Dulcina, e do próprio Noel ao vivo.
seria um total barato!
ter feito Doces Bárbaros, pra mim foi "diploma PHD". tive uma semana pra bolar, fazer, levar, pendurar e ficar olhando, PASMO! tinha conseguido.
em particular, agradeço à Sonia minha "fada madrinha" .
e ao Iácov que, pela 1a. vez, "iluminou" um espetáculo em que a cenografia nasceu junto: OTHELLO.
e ao Arquimedes, por ter me ensinado tudo sobre "o palco", e ainda me ensinar, e aos meus "alunos" que me obrigam a "sambar", e manter o ritmo de cintura.
necessário ao "passar do tempo"
assim, enfim, agradeço a Deus por existir.


maio 1983

Gerais/detalhe. Técnica mista, 1977

Sinto sempre o impulso que eu pinto
sintonizo e pinto
esse impulso me livra
me liberta me diverte me alerta
que amanhã haverá sol
mesmo que hoje eu morra
o outro dia é renascer do seu ser do sol
da chave maior que é a libertação da dor,
o amor
Refazendo.Técnica mista, coleção particular,1975


Bananeiras

sábado, 16 de maio de 2009

Registro 256: O teatro abriu caminhos...

Comecei a fazer teatro em Feira de Santana, no Teatro Experimental de Feira - TEF, mas não participei de montagens. O grupo estava em crise e durante o período não realizou nenhum espetáculo, mas a experiência serviu para solidificar um desejo: me tornar um homem de teatro.
Ingressei na Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia em 1968, o ano que começou bem, mas "não terminou". Ou melhor, terminou sob o AI-5. Fiz o Curso de Formação do Ator. Naquela época, um curso de nível médio. Por esse motivo fiz Licenciatura em História para ter o nível universitário, mas o teatro sempre esteve no centro das minhas atenções. Pelo teatro construi a minha identidade, que ao longo dos anos vem se modificando, já que a identidade não é algo fixo, imutável, como querem alguns.
Fiz espetáculos na Escola e fora dela. Alguns desses espetáculos estão registrados aqui.
Um momento importante de minha vida como aluno-ator foi o contato com professores significativos para a minha formação. Não vou nomeá-los para não ser indelicado com aqueles que passaram por mim sem deixar nenhuma marca positiva. Embora a culpa não seja deles, mas minha que não fui suficientemente interessado em descobrir o que poderiam trocar comigo.
Conclui o curso em quatro anos, pois a instituição não cumpria com a oferta de disciplinas no tempo regulamentar. Em 1973, por sugestão de José Possi Neto, solicitei uma disciplina optativa no curso de Direção e fui seu assistente em A Casa de Bernarda Alba, memorável espetáculo ainda hoje lembrado por muitos, como uma realização das mais significativas na história do teatro na Bahia. Em seguida fiz, como ator, Tito Andronico.
Em 1974 fui para São Paulo com o intuito de continuar a minha carreira e, durante 17 anos, estive ligado ao teatro como intérprete e em seguida como dramaturgo. Durante esse período e depois, quando me afastei do palco, vi muitas encenações e com elas refinei a minha sensibilidade, o meu olhar, a percepção com relação ao espetáculo. Aprendi com encenadores, atore, atries, cenógrafos, figurinistas, iluminadores, dramaturgos.
Entre a Escola de Teatro e a vida profissional em Salvador e São Paulo, participei de diversos espetáculos e leituras dramáticas, com destacados diretores e atores da cena brasileira. Por diversas vezes recebi críticas favoráveis ao meu trabalho como intérprete, principalmente aquelas vinda do companheiros de ofício. Em 1986 deixei de atuar e fui realizar outras atividades. Distanciei-me do teatro, mas ele continuou sendo um norte para minha vida. Mesmo distante permaneci grato aos deuses do teatro e também ao meu terapeuta que me ajudou a resolver uma porrada de dúvidas, inseguranças e por que não amar(guras).
Atualmente me dedico ao ensino e a pesquisa. Sou professor de teatro, isso me leva para muitos campos. Os registros fotográficos não estão completos, as imagens se perderam ao longo do tempo ou então foram doadas para o acervo da Funarte.
Parafraseando Walter Benjamin, em mim, o teatro abriu avenidas.
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1968
Os Incendiários, de Max Frish - Direção: Alberto D'Aversa. Departamento de Teatro da Escola de Música e Artes Cênicas - Teatro Santo Antônio
Bidermann, e os Incendiários
Raimundo Matos, Harildo Déda, Raimundo Blumetti, Gildásio Leite

O Fidalgo Aprendiz, de Francisco Manoel de Melo - Direção: Álvaro Guimarães - 10 Festival do Barroco na Bahia - Teatro Castro Alves.
A Companhia das Índias, de Nelson Araújo - Direção: Orlando Sena. Teatro Santo Antônio.
A Companhia das Índias

A Bela Adormecida, de Raimundo Blumetti - Direção: Deolindo Checcucci. Teatro Castro Alves.

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1969
Onde Há Uma Cruz, de Eugene O'Neill - Direção: Raimundo Melo. Departamento de Teatro da Escola de Música e Artes Cênicas - Teatro Santo Antônio.

Onde Há Uma Cruz
Raimundo Matos, Harildo Déda, Normalice Souza
A Bicicleta do Condenado, de Fernando Arrabal - Direção: Jesus Chediak. Departamento de Teatro da Escola de Música e Artes Cênicas - Teatro Santo Antônio.

O Circo de Bonecos, de Oscar Von Pfhul - Direção: Teresa Lopes. Departamento de Teatro da Escola de Música e Artes Cênicas - Teatro Santo Antônio.

Branca de Neve e os Sete Anões, adaptação de Chico Ribeiro e Maria Idalina – Direção: Maria Idalina. Teatro Castro Alves.

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1970
O Painel da Peste, de Igmar Bergman - Direção: Anatólio Oliveira - Departamento de Teatro da Escola de Música e Artes Cênicas - Teatro Santo Antônio.

Um Elefantinho Incomoda Muita Gente, de Oscar Von Pfhul – Direção: Maria Idalina. Teatro Castro Alves.

Macbeth, de William Shakespeare - Direção: Henrique Ariman - Teatro Castro Alves – Salvador.
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1971
Oficina de Papai Noel, de Maria Idalina – Direção Maria Idalina. Teatro Castro Alves.

O Embarque de Noé, de Maria Clara Machado – Direção: Roberto Assis Departamento de Música e Artes Cênicas – Teatro Santo Antônio.

O Consertador de Brinquedos, de Stela Leonardos - Direção: Maria Idalina. Teatro Castro Alves.
O Consertado de Brinquedos
Cilene Guedes, Raimundo Matos, Waldemar Nobre

Ensaio de O Consertador de Brinquedos
Haidil Linhares, Nei Galvão, Cilene Guedes, Raimundo Matos
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1972
A Bela Adormecida, adaptação de Raimundo Blumetti – Direção: Deolindo Checcucci. Teatro Castro Alves.
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1973
Tito Andronico, de William Shakesperare - Direção: José Possi Neto. Departamento de Teatro da Escola de Música e Artes - Teatro Santo Antônio.
Tito Andronico
Eduardo Esteves, Eduardo Calazans, Raimundo Matos, Gildásio Leite


Eduardo Esteves, Eduardo Tudella, Raimundo Matos, Gildásio Leite Jacques Beauvoir

As Feras, de Vinicius de Moraes - Direção: Álvaro Guimarães. Barração da Rua dos Ingleses.


Foto para divulgação de As Feras
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1974
A Perseguição, de Timochenco Webbi - Direção: Márcio Aurélio - Teatro Aliança Francesa do Butantã , Teatro de Arena - Porto Alegre.


A Morta, de Oswald de Andrade - Direção: Emílio Di Biasi. Sala Gil Vicente - Teatro: Ruth Escobar.


A Morta
Walter Marins, Raimundo Matos, Walquíria Lobo, Márcio De Luca
Bri Fiocca, Wilma de Souza
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1975
Tio Vânia, de Anton Tchecov - Direção: Emílio Di Biasi. Sala do Meio - Teatro Ruth Escobar.

Lição de Anatomia, de Carlos Mathus - Direção: Carlos Mathus. Auditório Augusta.
Cacilda Lanuza, Kadu Moliterno, Geraldo Del Rey
Beth Caruso, Herson Capri, Imara Reis, Raimundo Matos

Raimundo Matos, Geraldo Del Rey
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1977
Pedreira das Almas, de Jorge Andrade - Direção: Thereza Theriot. Teatro Alfredo Mesquita - São Paulo

Souzalândia, de Augusto Francisco - Direção: Roberto Lage. Teatro Oficina - São Paulo

Domingo, Zeppellin, de Marcos Vinincius - Direção: Silnei Siqueira.Teatro Aliança Francesa, Teatro Municipal de São Paulo.
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1978
Último Carro, de João das Neves - Direção: João das Neves. Pavilhão da Bienal.

Os Saltimbancos, adaptação de Chico Buarque - Direção: Silnei Siqueira. Tuca.

Lição de Anatomia, de Carlos Mathus - Direção: Carlos Mathus. Viagem pelo Brasil.
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1979
A Falecida, de Nelson Rodrigues - Direção: Osmar Rodrigues Cruz.Teatro Popular do Sesi.
A Falecida
Reinaldo Rezende, Paulo Prado, Ismael Rosan
Raimundo Matos, Luiz Parreiras
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1980
Quem Conta Um Conto Aumenta Um Ponto, de Raimundo Matos - Direção: Roberto Lage. Teatro Anchieta.

Quem Conta Um Conto Aumenta Um Ponto
Raimundo Matos, Cleide Queiros
Geni, de Chico Buarque e Marilena Ansaldi - Direção: José Possi Neto. Teatro Franco Zampari.

Geni
Marilena Ansaldi, Raimundo Matos, Ivan Lima

Raimundo Matos, Yeta Hansen, Armando Tirabosqui
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1981
Escuta, Zé, de William Reich e Marilena Ansaldi - Direção: Celso Nunes. Teatro Franco Zampari e viagem pelo Brasil.

Raimundo Matos

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1982
Coitado do Isidoro, de Sebastião de Almeida - Direção: Osmar Rodrigues Cruz - Teatro Popular do Sesi - Santo André.

Elenco e equipe técnica com o diretor Osmar Rodrigues Cruz
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1983
Casa de Brinquedos, de Toquinho e Elifas Andreatto - Direção: Mário Mazetti. Tuca.

Édipo Rei, de Sófocles - Direção: Marcio Aurélio – Galpão -Teatro Ruth Escobar - São Paulo e viagem pelo Brasil.

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1984
Um Beijo, Um Abraço, Um Aperto de Mão, de Naum Alves de Souza - Direção: Naum Alves de Souza.Teatro Maria Della Costa.
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1985
Madame Blavatski, de Plínio Marcos - Direção: Jorge Takla - Teatro Aliança Francesa.

Madame Blavatski
Raimundo Matos, George Otto, Thaia Perez,
Tony Brandão, Wladerez de Barros

Walderez de Barros, Raimundo Matos
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2000
Exercícios Cênicos, diversos autores. Mostra do XVI Curso Livre de Teatro, atividade de extensão da Escola de Teatro da UFBA - Direção: Raimundo Matos de Leão - Teatro Martins Gonçalves.
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2001
Píramo e Tisbe, de Vladimir Capella - XVI Curso Livre de Teatro - Direção: Raimundo Matos de Leão - Espaço Xisto.


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2005
Brincadeiras, de Raimundo Matos de Leão - Direção: Raimundo Matos de Leão. Teatro Isba.
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2006

Os da Mesa 10, de Oswaldo Dragun - Direção: Raimundo Matos de Leão. Teatro Isba.


Os da Mesa 10
Antonio Alcântara, Ricardo Faria
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2007
Yerma, de Federico Garcia Lorca - Direção: Raimundo Matos de Leão. Teatro Isba.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Registro 265: Pra Fanny Abramovich

A PROPÓSITO DA COMEMORAÇÃO
Escrever é uma extensão do hábito prazeroso de ler e é, sobretudo, uma maneira de dividir com o leitor uma parte desse prazer.

Tomei gosto pelos livros descobrindo-os na estante de tia Edna, professora em Baixa-Grande, Bahia. Pinóquio foi o primeiro livro a me fascinar. Depois, veio a descoberta de Lobato e seu universo, seus personagens inesquecíveis. Tanto me impressionaram que, aos dezoitos anos, fiz meu pai comprar toda a coleção de um vendedor que bateu a nossa porta. Anos mais tarde, já em São Paulo conheci apaixonados por Monteiro Lobato, entre eles Tatiana Belinki e Fanny Abramovich. Quando Fanny entrou na minha vida eu tinha escrito o meu primeiro texto de teatro para crianças, Brincadeiras. Por essa época, eu não imaginava que pudesse escrever outras peças e contos e romances curtos, mas ao mexer comigo, Fanny provocou. E dessa provocação descobri em mim possibilidades insuspeitadas.

Voltando a Lobato e aos meus dezoito anos: com outros olhos, reli cada livro do escritor, constatando a permanência do encanto original dos tempos de criança, quando eu ouvia histórias contadas por minha avó Rosinha, que de quebra, sempre narrava uma história de santo. Mais tarde fique sabendo chamar-se hagiografia.

À descoberta da leitura, juntou-se a gostosura de ouvir histórias; depois, vieram os livretos de cordel e, por fim, os livros ditos para adultos. Aí foi paixão desmesurada, sem critério, lendo tudo que caía nas mãos. Levei muito tempo para separar o joio do trigo. Isso não quer dizer que hoje em dia eu mantenha um rigor nas escolhas.

Entre a descoberta da leitura e a descoberta das possibilidades de me tornar um escrevinhador, decorreu muito tempo. E afirmo: quem me levou para a literatura foi o teatro. Como disse acima, escrevi Brincadeiras, com ela ganhei um prêmio que, depois vim saber, foi defendido com unhas e dentes por um dos membros da comissão julgadora: Fanny Abramovich. Ela me disse um dia que viu no texto inventividade.

No livro de Fanny, O estranho mundo que se mostra às crianças (Summus), há um capítulo destinado ao teatro infantil. No texto, publicado anteriormente no Jornal da Tarde, em 2 de setembro de 1978, Fanny discorre sobre o teatro para a infância e a juventude e completa seu texto com depoimento dos autores premiados no IV Concurso de Dramaturgia Infantil do Serviço Nacional de Teatro (1977). A partir desta matéria/entrevista, Fanny Abramovich entrou na minha vida de uma maneira provocadoramente lúdico-lúcida

Em 1987, quando dirigia a Coleção Estrela para a Editora Salesianas, Fanny me pediu que retrabalhasse uma história perdida no fundo de uma gaveta. Essa história se tornou o meu primeiro conto publicado: Um muro no meio do caminho. Foi um processo vivenciado com raro prazer. A história de um garoto que deseja um muro no meio do caminho para a escola parecia um despropósito, mas se tornou um exercício de imaginação e rebeldia, tanto para o personagem quanto para mim. Pena que a Editora interrompeu a coleção! Gosto de estar na coleção tendo como companheiros Vivina de Assis Viana (O rei dos cacos), Sylvia Ortoff (A mesa do botequim e seu amigo Joaquim e Dita-cuja, a coruja), João das Neves (A árvore cheia de estrelas) Flávio de Souza (Uma menina e um menino, Papel de carta, papel de embrulho e Filho de artista), Roseana Murray (Um avô e seu neto) e Fanny Abramovich (Deixa isso prá lá, vamos brincar).

Uma coisa puxa a outra e fui parar no Bambalalão, reprisado hoje na TV Rá-Tim-Bum. Escrever para o Bambalalão, programa para crianças produzido pela TV Cultura de São Paulo, me familiarizou com a linguagem do texto para a televisão. Semanalmente, escrevia histórias dramatizadas e pequenos contos para o elenco do programa. Divertia-me depois, vendo os atores improvisando e brincando em cima dos textos.

A entrada no universo da literatura juvenil se deu com o livro Primavera pop! publicado pela Editora Saraiva. Mais uma vez, o dedo de Fanny! Por sua indicação, encaminhei o trabalho para Cláudia Abeling-Szabo, responsável na época pela Coleção Jabuti. Primavera pop conta a história de Ana Maria e da sua amizade com tio Miguel, de quem ela descobre um caderno onde ele narra fatos da sua infância e adolescência. Conta também a relação da garota com a família, os colegas e sobretudo com seu primeiro namorado. As histórias de tio Miguel permeiam a história de Ana Maria com emoção e fantasia. O livro está nas livrarias.

Um segundo livro para jovens, Braçoabraço, é mais um título que tenho na Coleção Jabuti. O personagem central, Tuim, vive aventuras e desventuras quando é abandonado na cidade grande. Ao ser flagrado por um fotógrafo dormindo nos braços de uma estátua, vira primeira página de jornal. A partir daí, sua vida toma novos caminhos.

Outros trabalhos foram sendo produzidos e publicados: Da Costa do Ouro e Quem conta um conto aumenta um ponto (Saraiva), De cara para o futuro (SM), Bacanas e famosos no caderno de autógrafos, Um grilo no pedaço (Paulinas), Sob o signo das Luzes (FTD) Outros estão prontos a espera de editores. Novos projetos tomam corpo, outros são deixados de lado. Continuo o meu exercício diário, criando, recriando, destruindo e construindo, através de uma prática que implica em leitura, observação e exercícios imaginativos para dar vida aos personagens e suas ações num mundo do qual sou criador.

Procuro falar ao imaginário do leitor, acreditando na sua capacidade de desejar uma integração com o texto de tal forma que, ao acabar a leitura, ele possa se sentir motivado a dar continuidade ao exercício de ler e ter prazer, de ler e ser crítico, de ler e estabelecer um diálogo com as idéias... Aposto sempre na possibilidade de que este jogo se torne uma necessidade para sua vida, um contraponto para a mesmice que empobrece nosso cotidiano.

A obra literária torna-se um objeto social, que proporciona ao leitor uma vivência que de outra forma não poderia experienciar no cotidiano. Isso nos torna abertos para compreender a vivência de outras pessoas e de outras culturas. Acreditando nisso, vou tecendo as minhas histórias, como o galo de João Cabral de Melo Neto tece a manhã.

Ao escrever esse texto, aproveito a oportunidade para homenagear a minha amiga e incentivadora, Fanny Abramovich. Ela já vendeu mais de um milhão de livros, e escreve lindamente. No dia 16 de maio a escritora lança três livros, De surpresa em surpresa, Espelho, espelho meu e Três desejos tão desejados, todos pela Saraiva – Atual. Na ocasião Fanny comemora 20 anos de carreira. E que bela carreira: escritora, pedagoga, jornalista, consultora e descobridora de pessoas que iniciam seus caminhos pelas vias da escrevinhação, conduzidos pelos seus risos vibrantes e por sua torcida. Os ilustradores dos livros, Marcio Levman, Vivian Altman e Marcelo Cipis foram alunos de Fanny no Ginásio Israelita Brasileiro Scholem Aleicham, espaço educativo onde aprendi de fato a ser professor. Coincidentemente, os ilustres e talentosos ilustradores, já crescidos foram também meus alunos. A vida tece esses encontros, borda a afetividade, nos recheia de lembranças.

Existem pessoas que passam pelo mundo espalhando belezura e Fanny é uma delas. Ela espalha tudo isso nos seus livros, nos postais que me envia e nas conversas por telefone, sempre tarde da noite. Notívaga, a escritora está sempre pronta a prosear enquanto grilos cantam, estrelas piscam e alguns dormem.

Caso você encontre um dos livros – são muitos – de Fanny Abramovich, não deixe de abrir e se deliciar com uma prosa criativa, crítica, brincalhona, cheia de sentimentos, permeada de humanidade. Tenho todos eles autografados carinhosamente. Não posso estar na festa dos 20 anos como estive na festa comemorativa de um milhão de títulos vendidos. Mas estou na torcida, catando parabéns e esperando novos livros, porque Fanny não dorme no ponto. Ela escreve...
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Esse texto, anteriormente publicado em http://www.geocities.com.rmleao/ , endereço desativado, foi reescrito em função da comemoração dos 20 anos de carreira de Fanny Abarmovich.

domingo, 10 de maio de 2009

Registro 264: Depoimento VI

O jornal O Estado de S. Paulo em seu Caderno 2 - Cultura - sempre aos domingos - apresenta um espaço denominado Antologia Pessoal, no qual profissionais das artes dão o seu depoimento sobre assuntos de sua área. As perguntas não variam, são sempre as mesmas. Ao apropriar-me da idéia, acrescentei uma pergunta e reformulei algumas; basicamente são as mesmas do jornal.Assim, convido artistas baianos ou residentes em Salvador para deixar o seu depoimento no blog Cenadiária. Cada participante indicará um artista para que se forme uma rede de registros e opiniões. Semanalmente, a Cenadiária vai trazer uma personalidade do teatro baiano para o deleito do leitor. Divirta-se.
Antônio Marques, nascido em Conceição do Jacuípe, interior da Bahia, Antônio Marques é formado em Direção Teatral pela Universidade Federal da Bahia, em Artes Plásticas pela Universidade Católica do Salvador e Especialista em Fundamentos do Ensino da Arte pela Faculdade de Artes do Paraná. Diretor Artístico da Arte Sintonia Companhia de Teatro desde a sua formação, em 2000, onde dirigiu os espetáculos “Um Cravo na Lapela”, “A Serpente”, “Pedaço de Mim”, “A Lei e o Rei”, “Supernordestinos Contra o Monstro da Mandioca” e “Zona Contaminada”. Em 2008, dirigiu “O Submarino”, comédia de Miguel Falabella e Maria Carmem Barbosa, com Diogo Lopes Filho e Márcia Andrade. Fez curso de Direção Teatral com Fernando Guerreiro e de Dramaturgia com Aninha Franco. Em julho, sob sua direção, estréia o infanto-juvenil “H2Ópera”, de Luís Sérgio Ramos.

1 – Que atores ou atrizes cujo trabalho em teatro você acompanha?
Sou um grande apreciador do teatro baiano, acredito muito no teatro que fazemos aqui, não só pela qualidade que imprimimos em nossos trabalhos, mas também pela garra que temos, onde fazemos espetáculo com ou sem dinheiro, com a mesma entrega. Mas voltando a pergunta, além dos atores da Arte Sintonia – Cia que dirijo – Denise Correia, Lívia França, Leonardo Freitas e Gilson Garcia, muitos atores baianos me impressionam em cena, principalmente as mulheres, dentre elas: Cristiane Mendonça, Andréa Elia e Rita Assemany. Da nova geração, acompanho e gosto muito do trabalho de Simone Brault (com quem já tive o prazer de trabalhar) e Mariana Freire.

2 – Que atores ou atrizes de cinema compõem a sua galeria de favoritos?
Meryl Streep, sem dúvida! Toda as vezes que a vi interpretando fiquei fascinado. Nicole Kidman também faz parte da minha galeria, só acho que ela poderia escolher melhor os roteiros, mas é uma excelente atriz.

3 – Qual diretor de teatro cujo trabalho faz você retornar ao teatro?
Sou fruto da Escola de Teatro da UFBA, então, os meus mestres serão sempre minhas referências, por isso, acompanho de perto o trabalho de Luiz Marfuz, Deolindo Checcucci, Paulo Cunha, entre outros. No entanto, toda vez que assisto a um espetáculo de Fernando Guerreiro, saio maravilhado do teatro, porque por mais que já tenhamos visto suas encenações, ele sempre nos traz frescor, nos faz sair maravilhados, seja nas comédias rasgadas, com uma assinatura que só ele tem, ou em espetáculos densos, como “Calígula” e “Eqqus”.

4 – Dê exemplo de um criador teatral muito bom, mas injustiçado.
Pode ser eu? (risos)

5 – Cite uma criação teatral surpreendente e pela qual você não dava nada.
“Os homens são de marte... e é pra lá que eu vou!”, com a Mônica Martelli. Não dava nada pela peça, mesmo sabendo de todo o sucesso que já havia feito no eixo Rio/SP. Sai do teatro ligando para os amigos irem assistir.

6 – A cena baiano-brasileira tem alguns momentos teatrais antológicos. Cite algumas que marcaram sua vida.
Nossa, já assisti a tanta coisa boa! “Senhora dos Afogados”, resultado do Curso Livre da UFBA com direção de Paulo Cunha, “Abismo de Rosas” foi um espetáculo fascinante, “Lábaro Estrelado”, a primeira versão de “Cabaré da Raça”, hoje se perdeu, mas quando estreou era maravilhoso.

7 – Que encenação lhe fez mal, de tão perturbadora?
“O Sapato do meu Tio”, com direção de João Lima. Saí do teatro com minha vocação reafirmada.

8 – Que espetáculo teatral mais o fez pensar?
“Mestre Haroldo e os Meninos”, dirigido por Ewald Hackler. A peça fala de respeito, igualdade, mexe com questões raciais e, sem dúvida, me fez refletir sobre estes assuntos.

9 – Comédia é um gênero de segunda?
Comédia é um gênero de primeira, sem dúvida, quem não gosta de rir? Mas é necessário que tenhamos outros gêneros com casa cheia também.

10 – Cite uma peça difícil, mas significativa.
“Seu Bonfim”, com Fábio Vidal.

11 – Cite uma encenação que imagina ter sido memorável e você não viu.
“A Casa de Eros”, de Possi Neto, em comemoração aos 40 anos da Escola de Teatro da UFBA.

12 – Uma encenação difícil, mas inesquecível.
O ciclo de “Os Sertões”, encenado pela Oficina Uzyna Uzona, no Museu do Ritmo.

13 – Que texto(s) escrito(s) nos últimos dez anos merecia um lugar na história do teatro brasileiro?
“Abismo de Rosas” de Cláudio Simões e “Alta Noite”, de Elísio Lopes Jr.

14 – Qual o texto dramático clássico brasileiro, de qualquer tempo, você recomendaria encenações constantes?
“Eles não usam black-tie”, de Gianfrancesco Guarnieri. Mais do que nunca, é preciso entender que o coletivo vale mais do que o individual.

15 – Cite um(a) autor(a) sempre ausente dos cânones que merece seu aplauso?
Flávio Marinho, pela ausência de encenações de seus textos na Bahia.

18 – Que montagem (ou ator, autor, diretor, cenógrafo, figurinista, iluminador) festejado pela crítica você detestou?
Caramba, já assisti tanto mau teatro, (risos) vindo do Sul. Recentemente, assisti “O Manifesto”, protagonizado por Eva Wilma, mas lembro também que assisti, há alguns anos, “Gata em teto de zinco quente”, com Vera Fischer. Eu e meus amigos saímos constrangidos do teatro.

19 – E que montagem (ou ator, diretor, autor) demolida por críticos você gostou?
Não temos críticos em Salvador.

20 – Qual peça e personagem gostaria de fazer? Você pode escolher três.
“As Primícias” de Dias Gomes; “Coração Brasileiro” de Flávio Marinho e “Gota D’ água” de Chico Buarque.

21 – Que virtude você mais preza no teatro de qualidade?
Disciplina, comprometimento.

22 – O que mais incomoda você no mau teatro?
Salvador tem uma coisa que me incomoda: aqui, todo mundo pode ser autor, pode ser diretor, pode ser ator. Concordo, acho que todos podem, desde quando estude para isso. O que me irrita é que muita gente diz que não gosta de teatro e, por acaso, vai assistir a uma peça que um amigo fez de um curso qualquer, com um resultado qualquer, e vai sair de lá achando que assistiu a uma peça de teatro e convicto de que teatro é uma merda.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Registro 263: Livro sobre teatro na Bahia

Lançamento
Transas da cena em transe: teatro e contracultura na Bahia
(Edufba, 2009, 400 p., R$ 30,00)
Raimundo Matos de Leão
Dia 06 de maio de 2009, quarta-feira, a partir das 18h30m, na Galeria do Livro
(Espaço Unibanco Glauber Rocha).

Transas na Cena Transe, Teatro e Contracultura na Bahia, uma publicação da Edufba é derivado da tese defendida no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas – UFBA, em 2007. O livro aborda questões relativas ao teatro em meio ao idearia contracultural, investindo sua argumentação contra a afirmação de que a produção teatral que se dá de 1968 a 1974 é destituída de criticidade. Propondo outro ponto de vista, o livro apresenta e analisa a produção teatral para afirmar que não houve um “vazio cultural” durante o período em que o governo civil-militar esteve no poder e utilizou a censura e a repressão para calar os artistas. Tomando como fonte de sua pesquisa os jornais da época, o depoimento dos envolvidos com a produção teatral em Salvador e fontes secundárias, o professor Raimundo Matos de Leão dá continuidade à pesquisa sobre a história do teatro na Bahia a partir dos meados dos anos 1950, tema do seu livro anterior Abertura Para Outra Cena, O Moderno Teatro na Bahia, lançado em 2006, uma publicação da Edufba em conjunto com a Fundação Gregório de Mattos. Nessa obra, o autor cobre o período anterior à criação da Escola de Teatro para afirmar que a vida teatral em Salvador sofreu um impulso modernizador a partir da existência da instituição universitária dirigida por Martim Gonçalves. Transas na Cena em Transe avança pela década de setenta, para mostrar um momento significativo do teatro na Bahia, tema de pesquisa a quem vem se dedicando o autor.

Transas na Cena em Transe concentra-se no período que vai de 1967 a 1974, historicamente reconhecido como o auge da contracultura, do desbunde, da festa, da militância guerrilheira. As ações culturais desse período, conceituadas como imbuídas de romantismo revolucionário, inscrevem0-se como reação ao crescente autoritarismo do regime civil-militar. O teatro obriga-se a encontrar formas para manter-se vivo e nos palco de Salvador surgem encenações que traduzem de modo explícito as transformações por que passa a cena mundial. No livro, o autor apresenta os espetáculos, Uma Obra do Governo, Stopem, Stopem, Macbeth, O Futuro Está nos Ovos, Rito do Amor Amargo, Electra, O Diário de um Louco, A Casa de Bernarda Alba, Titus Andrônicus, revelando para o leitor de que maneira os encenadores conceberam seus trabalhos.

Mais informações no endereço on-line:
http://edufba.blogspot.com/
EDUFBA (71) 32836160
http://www.blogger.com/

Registro 262: Luiz Fernando ramos escreve sobre Boal

MAIS DO QUE PEÇAS, REFLEXÕES E IDEIAS IMORTALIZAM BOAL
Luiz Fernando Ramos
Crítico da Folha
(Folha de S. Paulo, 05.05.2009)

Há um consenso em torno de Augusto Boal. É a personalidade do teatro brasileiro mais conhecida internacionalmente, com livros traduzidos para vários idiomas e seu nome inserido nas principais enciclopédias teatrais. Se esse reconhecimento abrange a sua condição de dramaturgo e encenador, foi principalmente pelas suas ideias e reflexões teóricas que Boal se fez famoso.Sua primeira contribuição teórica relevante foi o "sistema coringa", surgido nos anos 60 no Teatro de Arena. Boal partiu das ideias de Bertolt Brecht, particularmente do efeito de estranhamento, em que se propõe ao ator uma distância de seu personagem, para que possa ver criticamente suas ações e permita ao público partilhar esse olhar crítico.Boal distanciou atores dos personagens por meio do uso coletivo dos papéis, com os atuantes compartilhando a mesma "máscara", ou característica social e psicológica.Essa técnica foi utilizada pela primeira vez em 1965, na encenação de "Arena Conta Zumbi", e aprimorou-se no espetáculo seguinte, "Arena Conta Tiradentes".
A "Poética" de Augusto Boal, como a chamou Anatol Rosenfeld, foi publicada sob o título "Elogio Fúnebre do Teatro Brasileiro Visto da Perspectiva do Arena". Rosenfeld apontou, no ensaio crítico "Heróis e Coringas", a incompreensão por Boal das teses de Brecht ao conceder aos protagonistas a empatia diante do público que recusava ao coro. Segundo Rosenfeld, mesmo reconhecendo a importância "singular" do ensaio de Boal "no pensamento estético brasileiro", essa opção favorecia uma identificação festiva do público com o herói, no caso Tiradentes, e traía as ideias de Brecht.
Com o livro "O Teatro do Oprimido e Outras Políticas Poéticas", de 1975, escrito no exílio na Argentina, Boal produziu sua obra teórica mais influente. Ali, combinou técnicas teatrais por ele criadas, como o teatro invisível, o teatro jornal e o teatro fórum, para mesclar a ação teatral e a ação política contra todas as formas de opressão -econômica, familiar, racial ou religiosa.Boal continuaria produzindo livros que aprofundavam aquela ideia fundamental, de que qualquer ser humano pode atuar em favor da transformação de si e do mundo. Em um de seus últimos ensaios, de 2006, discutiu o teatro do oprimido na perspectiva da sensibilidade dos bebês.O legado de Boal como pensador pode ser avaliado pelos inúmeros grupos, no mundo todo, que partem de seus exercícios e estratégias teatrais na militância política e nas práticas de ensino e de ação cultural. Muito menos que por suas peças e encenações, imortalizou-se pelos seus escritos.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Registro 261: Aderbal escreve sobre Boal

AUGUSTO FOI O NOSSO BRECHT
Aderbal Freire Filho
Diretor de teatro
O TEATRO brasileiro no mundo tem um nome: Augusto Boal. Vá a Amsterdã, entre numa livraria e peça um livro de Boal. Você não vai conseguir ler, a menos que saiba holandês. Boal está traduzido muito além do espanhol, do francês e do inglês. Mas não estou aqui para falar dos livros, quero falar do homem. E começo ouvindo esse homem falando, o ritmo da fala, a música que vai juntando frases harmoniosamente, com um pensamento claro, a cadência das palavras, uma respiração buscada no fundo do peito para uma frase mais e, depois, quando o raciocínio se completa, um volteio e um final em que os temas se fecham, com extraordinária clareza.
Estou ouvindo uma explicação que me deu sobre um seminário seu com atores da Royal Shakespeare Company. Ali, o teatro ainda tem a força dos seus melhores tempos -se você abre o programa de uma peça, vai encontrar duas páginas com os nomes de quem faz aquele teatro existir, começando com os de sua patrona e de seu presidente, Sua Majestade, a Rainha e Sua Alteza Real, o Príncipe de Gales, indo até os contrarregras e o pessoal da maquiagem, passando pelos atores, o centro de tudo. Isto é, ali está a Inglaterra inteira.Pois estava claro para a companhia que seus atores precisavam conhecer mister, dom Augusto Boal, artista capaz de fazer um teatro mais aberto para a sociedade do que qualquer outro, capaz de transformar o espectador em ator. E levaram Boal para conviver com eles, treinaram suas técnicas, sabendo que assim chegariam mais perto ainda do povo, como chegava o cidadão William Shakespeare. E digo cidadão pensando na frase de Boal, dia desses, na Unesco: "Cidadão não é aquele que vive em sociedade, é aquele que a transforma".
O Alcione Araújo me telefona, "não vou esquecer meu diálogo com o Boal para uma revista, à propósito da sua autobiografia". Geraldinho Carneiro me escreve, "as célebres façanhas poéticas e conceituais do Boal, o teatro invisível, o teatro do oprimido". Era preciso muitos fôlegos, por trás da voz mansa, para ter tanta presença no teatro do Brasil, do mundo, do seu tempo, de todos os tempos. Pode-se dizer muito dele. Prefiro escolher nesse abraço a lembrança de uma ação nacional, que talvez não tenha muita valia na sua cotação internacional, mas, céus, como enriqueceu o teatro brasileiro.
Em meados dos anos 50, Boal organiza o seminário de dramaturgia do Teatro de Arena, marco da história da nossa cena, e forma uma das nossas mais brilhantes gerações de autores, em que despontam Oduvaldo Vianna Filho, Gianfrancesco Guarnieri. Nunca me esqueci da sua Revolução na América do Sul, o teatro brasileiro moderno nascendo, sua geração botando o dendê no caldo que Nelson Rodrigues começara a preparar. E Arena Conta Zumbi, Tiradentes, outros brechts pelo mundo, me lembro de Santiago García, da Colômbia, e ouço Eugenio Barba dizendo "é o Brecht deles", foi nosso Brecht o Boal. Nos encontramos pela última vez na sala de espera do consultório do Flávio, para tratar de nossos corações, era véspera da sua viagem a Paris, onde receberia o título de embaixador mundial do teatro. E me disse, "na volta vamos tomar um vinho lá em casa". Não sabíamos que entre esse encontro e o vinho prometido "ia passar o famoso rio Aqueronte, o insuperável". Mas imagino que, ao lado de Cecília, tua querida e admirável companheira, a única voz que ouço te chamar de Augusto, diante do Arpoador, visto da janela do teu acolhedor apartamento, tomas esse vinho, imortal Augusto Boal.
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O texto de Aderbal foi bublicado no jornal Folha de S. Paulo, edição de 4 de maio de 2009. No registro anterior, indiquei dois textos que falam sobre a ação de Augusto Boal. Indico mais um, o livro de Iná Camargo Costa: A hora do teatro épico no Brasil (Graal,1996) . Vale conferir.

domingo, 3 de maio de 2009

Registro 260: Augusto Boal

Morreu Augusto Boal.
O teatro brasileiro perde uma das suas mais expressivas figuras. Ainda que discorde de alguns encaminhamentos que deu para o teatro depois de sua experiência frutuosa no Teatro de Arena de São Paulo, não me sinto confortável em apontar o que me incomoda no Teatro do Oprimido e seus derivados, Teatro Fórum, Teatro Invisível. Lembro que uma aluna, de quem gosto muito, fez seu trabalho de conclusão de curso tomando Boal e o Teatro do Oprimido como objeto de sua pesquisa. Na ocasião, disse-lhe que estava disposto a colaborar, mas que seria um crítico da tal metodologia. Ela não me ouviu. Depois me entrevistou, incluindo a minha fala no seu texto. A atriz finalizou sua pesquisa exitosamente, saindo-se muito bem, tanto no trabalho escrito quanto na sua apresentação pública. Foi segura na sua exposição e me emocionou.
Durante os meus anos de teatro que se estende de 1968 até agora, só conheci Boal pelos livros que deixou ou por aquilo que se escreveu sobre ele, e não é pouco. Não vi nenhum dos seus trabalhos para o palco, o que lamento.
Para quem se interessar em conhecer o trabalho de Augusto Boal, recomendo o livro de Edelcio Mostaço, Teatro e política: Arena, Oficina e Opinião, uma interpretação de cultura de esquerda (1982). Embora esgotado, pode-se encontrar um exemplar nas boas bibliotecas - se houver - das instituições de ensino do teatro. Outro texto interessante é de José Arrabal, Anos 70: momentos decisivos da arrancada, publicado em uma nova e cuidada edição da Aeroplano (2005). Vale a pena conferir os dois e se deter sobre eles. Existem outros. Mas esses estão sobre a minha mesa de trabalho, já que preparo material para as minhas aulas de História do Teatro Brasileiro II . Aproveito para lembrar que Mostaço nos deve uma reedição de seu livro. Sei que ele vem batalhando por isso. Tanto um autor quanto o outro apresentam Agusto Boal para o leitor e dimensionam seu trabalho, apontando os aspectos positivos de sua trajetória e de suas ideias, sem deixar de lado os aspectos que avaliam como negativo.
Através do cenógrafo Flávio Império, ouvi muitas histórias sobre o Teatro de Arena. Não as revelo, já que são confidências. E como Flávio Império não me autorizou a contá-las, calo-me. São histórias de bastidores. Falar de Augusto Boal é falar do Teatro de Arena, para mim, muito mais que do Teatro do Oprimido. É no Teatro da Teodoro Baima que ele vai dar corpo ao fazer-pensar teatro, marcando a sua passagem pela cena teatral brasileira de maneira muito forte. Toda essa experiência e a posterior estão registradas por ele em seus livros; Boal deixa como um legado de suma importância para quem deseja conhecer um percurso, uma vida dedicada inteiramente ao teatro. Um vida dedicada inteiramente ao teatro. Nos anos sessenta os jornais registram sua passagem por Salvador, participando de um Seminário na Escola de Teatro e de apresentações de espetáculos do Arena entre nós.
Aproveito a ocasião para reproduzir o texto publicado no jornal Folha de S. Paulo (03.05.2009):
Morreu na madrugada de ontem, aos 78 anos, no Rio, o teórico, diretor e dramaturgo Augusto Boal, expoente do teatro de resistência à ditadura no Brasil. Ele teve insuficiência respiratória, complicação decorrente de uma leucemia.Boal estava internado desde terça-feira com infecção nas vias respiratórias, segundo o Hospital Samaritano. Lutava contra a leucemia "havia vários anos", de acordo com seu filho Julian.
O corpo será cremado no fim da tarde de hoje, no Cemitério São Francisco Xavier.O diretor tornou-se mundialmente conhecido pelo teatro do oprimido, metodologia criada por ele em 1972 que conjuga teatro e ação social.Em 25 de março deste ano, em Paris, ele foi nomeado embaixador mundial do teatro pela Unesco. Na ocasião, encerrou seu discurso assim: "Atores somos todos nós, e cidadão não é aquele que vive em sociedade: é aquele que a transforma!".
Nascido em 1931, no Rio, Boal formou-se químico aos 21 anos, mas, aos 24, decidiu cursar teatro na Universidade Columbia (EUA). Um ano depois, em 1956, estreou como diretor no Teatro de Arena, em São Paulo, com a peça "Ratos e Homens", de John Steinbeck.Em 57, criou seu primeiro texto, a comédia "Marido Magro, Mulher Chata". Dois anos mais tarde, o sucesso de "Chapetuba Futebol Clube", com direção dele, confirmou o acerto da decisão do Arena de investir em dramaturgia nacional.
No começo dos anos 60, Boal foi um dos articuladores de um intercâmbio entre os grupos Arena e Oficina, que gerou espetáculos como "A Engrenagem" e "José, do Parto à Sepultura". Diretor deste último, Antônio Abujamra disse ontem que Boal "era a demonstração de que um diretor de teatro é um bicho social que tem de atuar com uma visão crítica". A partir de 62, ainda no Arena, esteve à frente de um movimento de nacionalização de textos clássicos, que incluiu montagens de "A Mandrágora", de Maquiavel, e "Tartufo", de Molière. Pouco após o golpe de 64, dirigiu no Rio o show "Opinião", que reuniu artistas num gesto de resistência ao regime. A partir daí, assinou musicais que recriavam biografias de personagens históricos, como "Arena Conta Zumbi" e "Arena Conta Tiradentes". Nessa série, criou o chamado "sistema coringa", em que atores se revezavam nos papéis.Entre 68 e 70, excursionou com o Arena por EUA, México e outros países.
Em 1971, foi preso pelo regime militar, pelas ligações com o Partido Comunista do Brasil. Três meses depois, ao ser solto, foi para os EUA e, em seguida, para Argentina e Portugal. Ali, começou a difundir o teatro do oprimido, em suas palavras, "uma metodologia transformadora que propõe o diálogo como meio de refletir e buscar alternativas para conflitos interpessoais e sociais".No exílio, escreveu "Mulheres de Atenas" (adaptação de "Lisístrata", de Aristófanes), com letras de Chico Buarque, que ontem lembrou: "A gente se correspondia muito e disso resultou a canção "Meu Caro Amigo" (1976), parceria com Francis Hime, destinada a ele. Nos últimos tempos [...], deixamos de nos ver, mas a amizade se manteve".Com a anistia, Boal retornou ao Brasil, em 1984. Em 1993, enveredou pela política: foi eleito vereador e usou as técnicas do teatro do oprimido para ouvir as queixas da população e elaborar projetos de lei.
Ficamos mais pobres.