domingo, 30 de novembro de 2008

Registro 221: O que vai em mim e o que vai por aí

  • Ando meio preguiçoso. Ando trancado, ensimesmado, afastado. Cultivo as minhas idiossincrasias, tentando não afetar os outros; nem vontade de falar eu tenho. "Ando meio desligado e nem sinto os pés no chão", diz uma das letras dos Mutantes... Quando eu era jovem gostava de ouvi-los. Ainda gosto e muito.
  • Por que escrevo? Para não me entupir. Tenho ouvido Bach. Me acalma. Recebi a visita de um sobrinho-afilhado. Veio trazer o convite de casamento. Os jovens ainda casam com pompa e circunstância. Ao ouvir Bach, ele comentou: "A música é introspectiva", mas queria dizer que eu estava na fossa (esse termo é geracional), conclui. Qual o termo atual para fossa?
  • MUITO, aquele encarte do jornal A Tarde (não me peça opinião sobre ele), edição de hoje, traz uma reportagem sobre aquelas moças (Sarajane, Carla Visi, Márcia Short, Cátia Guimma e Márcia Freire) que fizeram sucesso em cima do Trio Elétrico e foram defenestradas para o país das ostras. Uma pena! São talentosas as moças...tanto quanto as congêneres que vieram depois ou ao mesmo tempo e estão aí megainvestidas A reportagem não diz tudo. Mas posso imaginar o buraco onde estavam e onde estão. Imagino que por culpa dos outros e delas também. No mesmo encarte, a diretora da fundação Cultural do Estado da Bahia, fala, fala e não diz nada... aproveitável. Do mesmo jeito o doutor Francisco Bosco... um amontado de frases feitas. Salva-se a indicação que ele fez ao pai, João Bosco: ler Dois Irmãos, de Milton Hatoum. Salva-se também No verão, melhor é ser aut+ista, de Aninha Franco. Garota esperta essa Aninha!
  • Recebi o telefonema de uma amiga-irmã que reside no balneário Rio de Janeiro, a cidade mais linda do Brasil. Ela pediu ajuda para resolver um dos trechos desses intermináveis formulários para patrocínio cultural - financiamento para teatro. Ela quer montar um texto e vem labutando com o MINC e agora vai labutar com uma dessas empresas de telefonia. O trecho referido era sobre a contrapartida social: "O que seu projeto vai fazer para democratizar a cultura?" Balela para aplacar a má consciência da dita empresa e agradar o governo populista que inventou essa história de contrapartida social.. Conversamos e ela me disse que vai precisar de uma cirurgia para retirar um tumor. Não fez drama nem estava apavorada.
  • A Cidade do Salvador continua suja e barulhenta na mesma proporção.
  • Berlin Alexanderplatz, o enorme filme de Reiner Werner Fassbinder foi lançado em DVD. Vale a pena ver no silêncio da sala de estar, sem a inconveniência de se irritar com o "educado" público que escolhe as sala de cinema para conversar, namorar, comer pipoca e balas, conferir e atender o celular. Ô luzinha irritante! O pior é quando você reclama, os ditos se sentem injustiçados, agredidos, numa flagrante inversão de valores!
  • Ler tem sido o maior prazer. E como! Prazer solitário mesmo. Daí me pergunto: essa história de que a narrativa e o livro estão fadados a morrer faz parte de uma campanha orquestrada para gerar interesse por outras mídias e suas formas de expressão? Interessa a quem discutir e difundir tal idiotice? Desviar grana, só pode ser. Nada substitui o prazer da escolha do livro, de abrir sua páginas, sentir no tato o papel, deixar o cheiro penetrar as narinas e os olhos se encantar com a capa, a diagramação e depois disso mergulhar no imenso oceano das palavras. Esse contato é de uma sensualidade indescritível porque muito particular. Depois de alguns anos imerso nos livros teóricos, em virtude das obrigações acadêmicas, retomo ao febril e estoteante gosto pela ficção. Leio um livro a cada semana. Registro os que li na seguinte ordem: Um Sonho a Mais, de Doris Lessing; Pastoral Americana, de Philip Roth; As Brasas, de Sándor Márai; Diário de Escola, de Daniel Pennac; , de Josef Roth (deixou-me enchacardo de lágrimas. Ah, vi Milágrimas, o belo espetáculo de Ivaldo Bertazo na TV SESC. O pessoal que faz dança-conceitual contemporânea devia olhar com olhos de querer ver para aprender ou reaprender a dançar). Agora começo a leitura de Menino de Lugar Nenhum, de David Mitchell, depois de ler a biografia de Ruth Rachou, escrita por Bernadette Figueiredo e Izaías Almada, despertando-me doces e engraçadas lembranças. Recomendo todos. Mas faça a sua escolha guiado (a) por outras opiniões. Reafirmo o prazer da leitura e não vou teorizar sobre isso. Prazer que eu aprendi com tia Edna, professora da escola primária em Baixa Grande e Feira de Santana. Ela perdia-se na leitura e ganhava o dia! Deixo-me de herança esse gosto pela leitura. Quando leio, não vejo a hora passar. Quando me envolvo nas teias de um autor, deixo-me agarrar...
  • Por falar em livro, a Edufba + Eduneb reeditaram de Silio Boccanera Júnior O teatro na Bahia da Colônia à República (1800-1923). Certa feita, tive acesso ao livro na sua primeira edição. Por necessidade, não resisti, fiz uma cópia. Agora tenho a segunda edição (2008).
  • Cleise Mendes, foi minha orientadora no mestrado e doutorado, lançou A Gargalhada de Ulisses, a catarse na comédia , livro derivado de sua instigante tese.
  • O livro que escrevo vai saindo lentamente. Ainda sem título, seus personagens assaltam as minhas horas dedicadas a outras atividades. Ocupo-me deles sem pressa. Tenho outros livros na fila, esperando a resposta das editoras. Espera angustiante.
  • Os alunos do curso de Artes Cênicas da Faculdade Social fizeram trabalhos interessantes no Seminário Interdisciplinar e na Mostra Didática das disciplinas Encenação e Interpretação III. É lamentável que o curso esteja acabando, mas temos três semestres pela frente e muito trabalho e cena e solos e performances. Dionísio é mais!
  • Para aguentar domingo só mesmo escrevendo. Êta dia chato! Principalmente pós-meio-dia.
  • No Estadão de hoje, mais precisamente no caderno Cultura, José Marcos Coelho escreve Sons de uma América Desconhecida e nos informa sobre Elliot Carter, compositor americano que aos 90 anos continua compondo. Reconhecido somente nos "círculos da vanguarda - sobretudo européia", ele é um ilustre desconhecido em sua terra natal. Lá para as tantas, Coelho pergunta: "Será que o critério fundamental para se aferir a qualidade da música de um compositor contemporâneo é avaliar em que medida o público a compreende e aceita? Isso seria nivelar por baixo, com certeza". Diante do que tenho visto por aí, fico tentado e reconhecer que a norma é essa, meu caro Coelho. Mas a minha parca abertura mental diz que NÃO. Se assim fosse Arte e Artistas (com maiúscula, propositadamente) estariam perdidos para sempre. E não estão! Em meio a arte errada (vide http://www.cadernosgrampeados.zip.net) cultivada por um grupinho que se acha o supra-sumo da vanguarda e as aberrações avalizadas pelo grande público massificado, pérolas são cultivadas.
  • Por falar em publicão, durante uma sessão do espetáculo Hamlet (Shakespeare, Aderbal Freire Filho) no Teatro FAAP-São Paulo, uma espectadora sentada na primeira fila levantou um cartaz com a seguinte frase: "Eu sou sua piscininha. Jogue-se aqui". Os dizeres, fora de hora e de lugar, foram dirigidos ao ator Wagner Moura, que, pasmem, parou para ler o cartaz, perdendo a concentração e rompendo com o ritmo da encenação. Em que lugar fomos parar?
  • Pérolas aos porcos!
  • A polêmica Tom Zé x Caetano Veloso, cansa! É certo que Tom Zé foi limado no auge do Tropicalismo ou depois. O que aconteceu de fato nunca veio a público. Graças ao seu talento e a Arto Lindsey, Tom Zé ocupa o lugar que merece. Agora faz sucesso, mas acho que o rancor amarga ainda a sua alma. Pra quem cuidou de rosas no jardim do condomínio onde residiu, o sentimento que guarda, ainda, não lhe cai bem. Mas tudo gera dinheirinho na caixinha de dona baratinha e a polêmica serve pra isso. Um pouco de bossa devia guiar os passos dos dois, que se mostraram muitas vezes elegantes!
  • Por que escrevo? Para estender pontes entre meu coração e o coração de quem se dispõe a ler o que escrevo
  • Chega! Por hoje é só. Como dizia Sílvio Lamenha: Poesia é axial!