sábado, 7 de novembro de 2015

Registro 464: Um pássaro na mão e muitos voando




O pássaro adentrou a sala num voo claudicante. Pensei estar muito assustado. Por fim, ele pousa na moldura de um quadro incorporando-se a paisagem pintada e ficou ali olhando a parede. Achei estranho, tanto a posição quanto a sua quietude. Passado um tempo, deixei a sala sem perturbá-lo, na esperança de que a ave encontrasse a saída.

O tempo passou...

Retornando para a sala, não encontrei o pássaro no lugar onde o havia deixado, mas prestando mais atenção ouvi um barulho de asas. Um barulho aflito. Ainda mais atento, percebi que a ave estava atrás da cortina e presa entre o vidro e a grade pantográfica. Aproximei-me cautelosamente e cuidadosamente retirei-o daquela prisão. Ao entrar em contato com a minha mão e depois de ter alisado a sua cabeça, o pássaro acalmou-se. Fiz a foto e soltei-a pela janela por onde tinha entrara.

Em vez de voar como eu esperava, momentaneamente, ela ficou parada na palma da minha mão, com o se não soubesse o que fazer. Em seguida voou. Pelo bater das asas vi que estava machucada. Insegura, a ave pousou num carro estacionado no outro lado da rua. Fiquei olhando-a preocupado com seu destino. Está é a história do pássaro em minha mão.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Registro 463: Sobre "Hereges" de Leonardo Padura


"Para ele, vendo sua obra (de Rembrandt), uma coisa ficou evidente: a arte é poder. Só isto, ou especialmente isto: poder. Não para dominar países e transformar a sociedade, para provocar revoluções ou oprimir os outros. É poder para tocar a alma dos homens e, ainda, deixar nela as sementes de seu aprimoramento e felicidade".

O texto foi transcrito de "Hereges", romance do cubano Leonardo Padura. Ao encontrar o parágrafo dentre os muito que gostaria de transcrever, escolhi este por sua dimensão e porque diz aquilo que penso sobre o papel da arte, ontem e hoje.


O livro de Padura é essencialmente sobre a liberdade, o livre arbítrio em qualquer circunstância. Esta proposição, vinda de uma cubano contemporâneo torna-se imensa no que ela tem de real ou diz sobre o real. Três personagens (um judeu, uma garota cubana que é "emo" e um judeu sefardi discípulo do pintor holandês Rembrandt, portanto vivendo no século XVII) lutam pelo direito de escolha independente de mestre, seja ele político, religioso, etc. São 503 páginas lidas com vontade sôfrega, maneira que temos de controlar para saborear o texto, sem que se perca a beleza da escrita e a envolvente ação.