quinta-feira, 23 de maio de 2013

Registro 430: MUST - Fala Baixo Senão Eu Grito



Idealizada e realizada pela Kalik Produções Artísticas, a 3a. Mostra Universitária de Teatro - MUST, acontece na Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia, contando com 13 espetáculos: Anti-Nelson Rodrigues - UESB, Quê Onde - UFG, Só Não Viu Quem Não Quis - UFRJ, Fala Baixo Senão Eu Grito - UFBA, Um Lugar Para Ficar em Pé - UFC, As Pererecas - Com o Se Tornar Uma Besta - UFMG, A Rampa - UFBA, Lumus - UFBA, Amnésis - UFBA, Propriedade Condenada - UFBA, Trançados de Memória de Uma Atriz-Brincante - UFBA,  Estilhaços e Algo Assim, PAP, O Rio, UNESP. A programação incluí a leitura dramática do texto de Diego Pinheiro, O Sol de Dezembro. Atividades formativas completam o quadro deste evento em sua terceira edição.

O valor do acontecimento é inegável, visto que seu objetivo principal é mostrar ao público interessado os espetáculos produzidos no âmbito das universidades brasileiras. 

É presente na programação a diversidade de temas e formas. Não foi possível ver os espetáculo na sua totalidade. De qualquer maneira, não posso deixar de registrar as minhas impressões sobre Fala Baixo Senão Eu Grito, espetáculo apresentado na Sala 5 da Escola de Teatro.

O primeiro aspecto que aponto sobre Fala Baixo Senão Eu Grito, primeiro texto da dramaturga paulista Leilah Assumpção, é a sua atualidade. Estreado em 1969, a dramaturgia permanece inteira, tanto na forma quanto no seu tema, as fantasias de Mariazinha Mendonça de Morais, uma funcionária pública solteira e infantilizada, mas poderia ser outra profissional qualquer. O que importa é a sua vida interior.

A personagem vive enclausurada em seu quarto de pensionato e confronta-se com um Homem que se diz ladrão. Este personagem surge não se sabe de onde. No encontro de mundos tão diversos, o da moça de classe média criada dentro dos valores tradicionais e do homem, um ser marginal, provoca momentos de intenso lirismo ao mesmo tempo que preenche a cena de manifesta dramaticidade quando o choque se concretiza. 

À medida que a situação se desenrola, percebe-se que, tanto Mariazinha quanto o invasor são seres solitários, vítimas de sua classe e da cidade que os engole. No entanto, o ladrão desencadeia um processo de desconstrução do mundo organizado da mulher, preocupada em trabalhar para pagar as prestações do apartamento A  dramaturga tira partido do jogo que se estabelece entre os dois. Das provocações do ladrão emergem o sufocado mundo da protagonista que se desestrutura ao limite da exaustão. Tentando fazer com que Mariazinha compreenda o vazio de sua existência, o Homem provoca-a de maneira assustadoramente invasiva, fazendo com que a personagem se dê conta da solidão em que vive e a partir da constatação de "não caber mais nas coisas" possa tomar as rédeas de sua vida de uma maneira libertadora. É o que se espera

Com seu texto, Leilah Assumpção insere-se no ciclo denominado de Nova Dramaturgia que sinaliza a estreia de jovens autores que passam a escrever para o palco no final da década de sessenta. Em seu texto, pode-se notar rompimentos com a estrutura tradicional da arquitetura do drama para dar conta da dramatização do eu uma questão de difícil solução em term os cênicos e mesmo dramático, mas não irrealizável como demonstra o texto objeto desta apreciação e também de outros que formam o quadro da dramaturgia moderna. 

Ainda que as regras de ação, tempo e lugar estejam presentes na estrutura do texto, percebe-se outros recursos utilizados pela autora para dar conta da interioridade da personagem. Interessante é o jogo imaginário que se faz presente no mundo real de Mariazinha. Ao ser instigada pela energia vital do Homem, proponente do jogo-do-faz-conta, a personagem presa às convenções de seu mundo, responde às fantasias, imprimindo um caráter onírico no desenrolar da ação. 

A encenação creditada ao aluno-diretor Georgenes Isaac oferece ao espectador momentos de intensa poesia, irresistíveis doses de comicidade alternando-se com a dramaticidade que toma conta da cena. Compreendendo muito bem a dramaturgia de Leilah Assumpção, o aluno-diretor prestes a concluir seu curso de Direção Teatral na Escola de Teatro, mostra habilidade na condução dos atores e na maneira como estrutura a relação entre eles. Dinamizando o diálogo, Issac imprime um ritmo que se acelera em função do jogo, da situação e do conflito. Cria marcações precisas para evidenciar este encontro inusitado. 

Sabemos que as condições para um espetáculo caracterizado como de pré-formatura não conta com os recursos necessários para o bom acabamento da encenação, ou seja cenografia, figurino, objetos de cena. Fala Baixo Senão Eu Grito padece desta limitação. Mas Georgenes Isaac e sua equipe consegue dar conta do mínimo para fazer com que os elementos que compõem o espaço - quarto de Mariazinha - resulte aceitável, visto que os elementos visuais estão inseridos no universo da encenação. Ainda que simples e sem muita invenção, servem aos propósitos da direção. A utilização de projeção é coerente com a sua concepção, deixando de ser um efeito plástico para tornar-se uma signo em meio a outros. Utilizando-se de uma  trilha sonora coerente e criadora da atmosfera - a cena do aparecimento do ladrão, por exemplo - por vezes extrapola no volume, encobrindo o diálogo. Outro elemento necessitando de melhor concepção e realização é a luz. Sanado tais problemas, o espetáculo pode fazer carreira em qualquer teatro de Salvador. Uma pena que a equipe não consiga contatar com a autora para negociar os direitos autorais para que possa se aventurar pela ribaltas além do muro da Escola.

Ponto alto do espetáculo são os dois atores. Patrícia Oliveira e Vinícius Martins dão conta do recado e mostram de maneira intensa  o desenho das personagens. Desenho feito com tintas fortes, mas que não deixa de mostrar as nuances exigidas pelos papéis que "vivem". As interpretações cativam os espectadores pela maneira, pois os atores expressam o texto de maneira precisa, todo ele encarnado nos corpos que se deslocam no espaço, cumprindo o desenho proposto pelo encenador de uma maneira orgânica. 

É visível o domínio dos recursos expressivos dos dois intérpretes. Domínio do tempo-ritmo, compreensão do sentido de cada frase, expressões faciais reveladoras de uma interpretação interiorizada que se exterioriza nos gestos, nos movimentos de um corpo que se manifesta inteiro no interior da ação dramática. Não lhes falta folego, nem técnica nem emoção e sobretudo, compreensão das personagens, da proposta da autora e principalmente do jovem diretor.

O entusiasmo com que a plateia acompanhou o espetáculo e os  aplausos calorosos no final é demonstração de sua eficaz capacidade de comunicação. Por conta das reações, pode-se afirmar que o texto  permanece com sua potência, não se perdendo na datação que pode lhe afetar. Por mais que o mundo feminino tenha se libertado de muitas amarras e que as mulheres tenham garantido conquistas, a situação de Mariazinha não nos escapa, ela é plauzível. Vista sob a ótica de Leilah Assumpção e de Georgenes Issac, a situação da personagem ainda é atual. 

domingo, 12 de maio de 2013

Registro 429: 13 de maio

A minha homenagem aos fizeram a Campanha da Abolição. Sem eles e sem Isabel, a prática da escravidão permaneceria como uma marca indelével. Ainda hoje, as formas de escravismo são visíveis, manifestando-se diariamente sob diversas formas, mas graças a brasileiros humanistas tornamo-nos mais dignos. A data, 13 de maio, não deve ser esquecida, apagada. Caso aconteça, estaremos traindo todos aqueles que lutaram para fazer as leis possibilitadoras da Lei Áurea. Querer diminuir tal acontecimento, reescrevendo a História doutra forma, é enganar-se e aos outros. 

É preciso lembrar.. Não esquecer. Uma mulher levada por muitos motivos, não importa quais, assinou um papel e garantiu a liberdade de muitos. Ainda que está liberdade tenha sido mal cumprida, ainda assim, eles, homens, mulheres e crianças deixaram de ser considerados animais para serem humanos.  

É certo que vivemos em um país preconceituoso, mas a escravidão hoje se traduz na péssima educação oferecida às crianças do ensino fundamental e aos jovens do ensino médio nas escolas públicas deste imenso território. Sem uma educação de qualidade como mudar as mentalidades?

Esta mulher, certo dia, num baile, ao ver um negro, político e intelectual importante do seu reinado, ter sido recusado por uma senhorita que convidara para valsar, a princesa ofereceu-lhe o braço e dançaram para espanto de muitos.

Não esquecer para lembrar os feitos de muitos. As atrocidades dos vencedores, o sofrimento dos vencidos, a determinação dos que lutaram por escrever uma outra página.

É certo que os libertos, não todos, ficaram desprotegidos. Aqueles que não tinham comprado a alforria e subido na escala social perambularam pelas estradas sem ter o que fazer. Eram milhares. Sem ter o que fazer, mas sabendo que podiam escolher seguiram os caminhos, marcando-os com suas vidas as nossas.

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Registro 428: Mais um absurdo baiano

Pense num absurdo, na Bahia acontece. 

A frase de Otávio Mangabeira é conhecida ao extremo, não porque queiramos usá-la exaustivamente tornando-a lugar comum. Mas, a cada dia, na Bahia, nos deparamos com absurdos. No momento,  é o descabido projeto do vereador Marcell Moraes do Partido Verde. Ele propõe a proibição de sacrifícios de animais nos cultos religiosos, a saber candomblé e umbanda. 

Não sabe o dito vereador que os animais imolados além de ser oferenda, alimenta a comunidade, não só dos adeptos, mas dos convidados. Nas festas, costuma-se servir um prato aos que estão na casa de culto e esta comida alimenta muita gente. Por vezes gente carente.

Além do mais, numa sociedade que se alimenta basicamente de animais abatidos cotidianamente, o projeto torna-se um delírio de quem não tem o que fazer. 

Aliás, o Partido Verde deveria cuidar de outros projetos, por exemplo, arborizar a cidade, torná-la mais condizente com clima. Acredito que o vereador deve passar diariamente pela Avenida Sete, trecho da Vitória, e perceber que as árvores tornam o logradouro aprazível. Portanto, aí está uma boa ideia. 

Intrometer-se num ritual antigo e de grande força é não ter o que fazer. Ou então é querer aparecer, ter os cinco minutos de fama. Espero que os senhores vereadores não aprovem este projeto inoportuno, descabido e tonto. 

Chega de achar que animais tem direito. Não tem. Nós e que temos deveres para com eles. Mas levar ao extremo a proibição do sacrifício é uma ideia fora do lugar.

Diante de tantas atrocidades, ir de encontro a preceitos de uma religião me parece fobia. 

Gostaria de saber quais são os hábitos alimentares do vereador.