sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Registro 290: Estado laico

Vale a pena ler em A Tarde de hoje, 18 de dezembro, 2009, o artigo de Luiz Mott Estado Laico. O antropólogo vai na mosca e deixa uma alerta. Transcrevo um trecho: "Merece aplauso o poder público ao negar privilégio aos estudantes religiosos que recusam fazer provas do Enem no sábado. Devem ser multados ou caçado o alvará dos templos que desrespeitam o sagrado direito de repouso do cidadão, cujo sono é prejudicado pelos ruídos infernais de liturgias e alto-falantes. O sábado foi criado para o homem e não o homem para o sábado, disse Jesus."

domingo, 13 de dezembro de 2009

Registro 289: 13 de dezembro

Hoje, 13 de dezembro, é dia de Santa Luzia, a padroeira dos que não veem a luz. A festa é celebrada em Salvador na igreja dedicada a ela, uma belo conjunto arquitetônico que vive uma processo de restaura arrastado sem que se saiba até quando se concluirá. Os órgãos encarregados de cuidar do patrimônio de pedra e cal devem saber.
O conjunto fica situado numa área degrada da Cidade Baixa, nada convidativa para uma visita, mas no dia 13, os fiéis vão pegar a água da fonte dita milagrosa. Gosto da santa por essa simbologia ligada ao ver e a sua incapacidade. Embora se possa ver de muitas maneira: a linguagem dos sinais está aí para que os privados da visão possam ver.
Dia 13 de dezembro é também a data de aniversário do malfadado e miserável e estúpido Ato Institucional Número 5 editado pelo governo civil-militar em 1968. Não lembro de ter ouvido sua proclamação já que no horário em que a notícia foi dada em cadeia nacional, eu devia estar ensaiando Biedermann, e Os Incendiários, texto de Max Frisch sob a direção de Alberto D' Áversa na Escola de Teatro da UFBA. Mas lembro-me bem dos seus efeito deletérios sobre a vida de todos nós.
Dentre seus efeitos, o que atingiu a minha categoria, a dos artistas, a maior foi a censura. Se é que posso dizer maior, já que o AI5 castrava toda possibilidade de manifestação de quqluer categoria. Mas a censura ao teatro, ao cinema, as artes plásticas e a literatura foi grandemente danosa. A Segunda Bienal de Artes Plástica da Bahia, aberta no Convento da Lapa foi fechada e muitas obras retiradas a partir da sanha proibitiva do governo. O passando nos olha dizendo que devemos ficar atentos, como aquela canção de que diz a mesma coisa.
Após 24 anos anos da queda do regime militar, depois da redemocratização e da Constituição que se fez depois da Abertura e nos rege, eis que o Supremo Tribunal Federal nos joga no túnel do tempo e nos deixa assombrados ao manter a censura ao jornal O Estado de S. Paulo. E para isso seis ministros usam de firulas, mantendo-se aferrados a princípios que ferem a Constituição cujo artigo 220, diz que "é vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica ou artística", tudo isso para esconder-proteger a família Sarney, sem que se possa acompanhar o andamento das investigações.
Aproveito para citar mensagem enviada ao Estado pelo professor Plácido Z. Táboas. Diz o texto: "A frase 'se é inviolável a honra e a intimidade, é preciso que isso tenha alguma consequência' não seria mais apropriada para o caso do caseiro Francelino Costa? Provavelmente o mesmo ministro não a tenha proferido naquela ocasião porque então se julgava a violação do sigilo bancário de uma pessoa comum, perpetrada por essas pessoas incomuns. Nenhum Poder da República se salva...' (O Estado de São Paulo, 13 de dezembro de 2009, p.A 2)
O desprezo pela Constituição abre perigoso precedente. E como não sabemos o que se arma nos corredores do Poder, somos levados a terríveis fantasias ou não? Espero que o fantasma da ditadura, seja ela de direita ou de esquerda, não se apresente no horizonte do país.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Registro 296: Espanto!

Ontem (04.12.2009), dia da padroeira das tempestades, de calor intenso e muita luminosidade, deparo-me na edição de A Tarde com uma carta em defesa da Marcha da Maconha. Nada contra. Marcha-se por tanta coisa, umas até indefensáveis! Outra nem tanto.
O meu espanto não é fruto nem da Marcha nem da carta. Mas através dela fico sabendo que o sociólogo Renato Cinco estabelece uma relação entre a repressão ao tráfico como sendo uma questão abolicionista, ou melhor antiabolicionista, visto que para ele, os perseguidos, pessoas ligadas ao tráfico, são "negros" e "pobres". Por serem negros e pobres são vítimas do preconceito e a perseguição se dá por essa condição. Penso ser uma distorção. Não me parece que o tráfico esteja associado a essa ou aquela etnia nem é uma questão de classe.
Se a contravenção está instalada nas regiões onde se encontram moradores de baixa renda, não podemos sair em defesa da criminalidade por conta da pobreza e de serem negros o contrataventores. O tráfico também se instala em outras camadas da sociedade e o problema deve ser atacado do ponto de vista da criminalidade, seja ela conduzida por qualquer pessoa. Não sendo assim, instala-se a barbárie! O que se persegue não são negros e pobres, assim me parece, mas contraventores, "comerciantes" ilegais de drogas, algumas delas mortais. E essa ação não fica circunscrita ao ciclo de venda e consumo, não necessariamente nessa ordem. O comércio ilegal na mão de brancos ou negros, leva a um ciclo de horror derivado da violência gerada por esse ambiente.
O posicionamento do sociólogo escamoteia, desvia e tenta criar uma falácia. Depois, quando se diz que a sociologia serve para tudo e não serve para nada, desperta-se o furor dos sociólogos de plantão. Mas teses estapafúrdias como estas causam espanto e são perigosas. Não creio que a luta para vencer o preconceito e incluir passe por essa ótica. Não creio que tal tese amplie a discussão sobre a legalização das drogas, assunto complexo que não deve ser discutido por esse viés. Essa visão idealizada do povo não faz avançar as suas questões nem contribui para o processo transformador. A que ponto nós chegamos!

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Registro 295: Corajoso posicionamento

Meu nome é dirigismo, e escreve-se na pedra!

Gideon Rosa

Ator e jornalista

A classe artística pode e deve imediatamente reagir a declaração (jornal A TARDE, 27.11.2009, pág. A-8, editoria de Salvador) arrogante e cínica do diretor do Teatro Castro Alves quando, para tentar justificar a ausência de inscrições para os editais do Núcleo do TCA, disse: “Meu questionamento a isso tudo é que talvez essa propalada crise na cultura esteja acontecendo dentro do cerne (sic) dos criadores. Mas vamos relançar o edital do tema livre ainda em dezembro em data a ser anunciada até o fim da semana que vem... no caso de novamente não haver inscritos com documentação em ordem minha posição é de que não haja uma terceira tentativa... “

Os stanilistas remanescentes – no Brasil e no mundo – devem estar todos com os pelos eriçados. Jamais, em tempo em algum, foram tão competentes quantos esses gestores da cultura baiana: eles possuem talento inigualável para mentir, distorcer, manipular, cooptar, coagir pela força do vil metal e, principalmente, enriquecer aproveitando as brechas da legislação, mantendo a cara de humildade.

Qualquer gestor com uma vírgula de humildade iria desejar investigar as razões pelas quais os artistas baianos não quiseram se inscrever nos editais do Núcleo do TCA. Se assim o fizesse, iria descobrir que a razão pela qual os artistas se afastaram – àqueles que ainda possuem brios e respeito pelo seu ofício – é pelo simples fato de não desejarem se submeter ao atual grau de dirigismo do processo criativo embutido nos editais. Os editais estão atualmente configurados de modo nocivo à produção artística, e, claro, ao processo criativo. Os editais são – todos, indistintamente, não importa a unidade, se na Funceb, se no Irdeb, se no TCA, em qualquer campo – um emaranhado manual de como os artistas devem manejar seu processo criativo. Isso é uma afronta inaceitável para quem se respeita!

Aí então, àqueles que ainda possuem algum discernimento se recusam a concorrer a um prêmio de R$ 200 mil para uma montagem (menos o desconto linear de 20%), cujo edital estipula um número mínimo e máximo de atores, o que configura uma descarada ideologia de reparação social através da arte. Além disso, exige-se um piso salarial de R$ 2.500,00 (para atores) e técnicos (variadas faixas) durante três meses. Mas esquecem de fazer as contas. Quem é o artista que, antes de começar, conhece todas as démarches do processo criativo? Ainda não nasceu quem o soubesse. Um processo criativo pode durar um mês, 14 ensaios, 40 ensaios, não há parâmetro; só as necessidades do trabalho vão determinando isso.

Para agravar, os editais exigem que os ganhadores ministrem uma série de oficinas tão idiotas que o coitado passará mais tempo elaborando as oficinas (se for honesto, claro) que não terá tempo de pensar artisticamente em sua própria montagem. Sem falar que as parcelas não são pagas no tempo devido, mas as despesas de produção não esperam, e a prova disso é que a última produção do Núcleo do TCA (Jeremias...) teve um final melancólico: dívidas, brigas internas, inadimplência, troca de elenco etc.

Mas os editais da Funarte, Caixa Cultural, Petrobrás e outros que existem por aí têm salvo parcialmente a situação. A vitória dos artistas baianos nesses editais externos comprova, com clareza, que os artistas baianos não estão em crise criativa. A crise é, verdadeiramente, de gestão, de ausência de um plano para as artes, como confessou publicamente o próprio secretário, muito embora a grande mídia não tenha registrado essa frase emblemática. Em resumo, são esses editais externos que permitem que se dê uma pequena volta por cima dessa perseguição implacável aos artistas implementada pelos atuais gestores da cultura baiana. São eles que têm mantido a dignidade mínima da produção artística da Bahia. Poderia ser mais, mas a arrogância resolveu colocar tudo no mesmo balaio e o resultado é uma confusão da qual nem eles próprios conseguirão mais sair.

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Publico o texto do ator Gideon Rosa, pois trata-se de um pensamento corajoso a respeito de uma questão que não pode ser deixada de lado. Se a culpa está na política cultural do atual governo, refletindo-se em uma edital que não desperta interesse entre os artistas de teatro, é necessário que os mandatários revejam sua postura. Ainda que estejam nos cargos para se colocarem na defesa de uma proposta político-partidária, que repensem suas ações à luz do bom senso, visto que tal projeto vem se mostrando ineficaz. Que as palavras de Gideon Rosa se propague, não como assunto de fofoca, mas como um alerta para todos os artistas e principalmente para aqueles que estão no poder. Poder passageiro, diga-se de passagem! A vingança não é a melhor atitude.