domingo, 23 de agosto de 2009

Registro 281: Impressões

A semana foi de ver arte, a do cinema (Tempos de Paz, direção de Daniel Filho e o delicado Horas de Verão de Olivier Assays) e a do teatro (A Canoa, direção Jacyan Castilho, com o ator Claudio Machado, Uma Vez, Nada Mais, direção Hebe Alves, com as atrizes Maria Menezes e Aicha Marques e Pluft, Fantasminha, direção Susan Kalik, no elenco: Anderson Dy Souza, Angela Reis, Caio Muniz, Francisco Xavier, Hayaldo Copque, Luiz Guimarães, Sérgio Telle, Sunny Mello).
Como faz bem ver objetos de arte tão significativos! Não quero dizer sem defeitos. Todas eles tem os seus problemas, mas no resultado final são belos objetos, obras de arte. O leitor pode fazer objeções: dizer que obra de arte é aquela que em sua totalidade não apresenta nenhuma fissura nem no tema e nem na forma. Os elementos semânticos e sintáticos se organizam, sem que se dê a sobreposição de um sobre o outro. Não discordo. Mas diante do que vi, e tomado pela força que emana desses objetos, deixo de lado os conceitos para me deixar levar por aquilo que cada uma delas fez em mim.

O fato é a arte anima a gente, nos conforta, às vezes nos tira o equilíbrio desassossegando-nos. Falo por mim; a generalização fica por conta do desejo de que todos, homens e mulheres, fossem tocados pelo universo da arte.
Diante da sujeira que rola noutras áreas, o que vai pela arte desse meu Brasil brasileiro diz muito do que esse país poderia ser e não é. Com essa afirmação, não quero dizer que a arte nos redime, purifica, salva. Coitado de quem acredita nisso. No entanto, penso que ela é um forte antídoto contra a barbárie. Nesse sentido, ela produz efeitos. Não faço aqui a defesa acrítica dos artistas. Alguns agem também como os políticos. Alguns são até políticos...
Penso na carta que recebi por e-mail assinada pelo ator Marcelo Prado. De tudo que li e ouvi sobre a política cultural do governo Jacques Wagner foi a que mais me tocou. Some-se a ela, os textos do ator e jornalista Gideon Rosa. Solidarizo-me com os artistas meus companheiros...
Não tenho a mínima vontade de usar o vocábulo, mas ele diz muito e independentemente do jargão que identifica partidários. Eu não sou um homem de partido, mas de um tempo partido, como disse o poeta.
Não me deterei em analisar o que vi. O certo é que saí das sessões carregando uma onda de sentimentos e pensamentos. Mas cabe um pequeno registro sobre cada trabalho que vi:
Tempos de Paz: o cinema quer ser teatro, mas é cinema e dos bons. Dois atores em momento luminoso. Para quem um dia deixou o palco como eu, o filme me coloca diante de dilemas. Alguns resolvidos, outros empurrados para debaixo do tapete.
Horas de Verão: a vida passada a limpo sem melodrama. As emoções pulsam na medida certa.
A Canoa: inventivo exercício de direção, um ator com bastante recursos expressivos necessitando mergulhar mais fundo nas sutilezas das emoções que a partitura corporal lhe exige e que o tema reclama.
Uma Vez, Nada Mais: duas atrizes em plena forma, exercendo o jogo fascinante do teatro e encantando. Uma direção segura e a serviço das intérpretes.
Pluf, Fantasminha: no programa da peça tem uma frase do ator Harildo Déda que diz assim: "O que me impressiona em Maria Clara, é o poder que ela tem de transformar poesia em dramaturgia". A frase diz tanto de maneira tão sintética. O espetáculo tem seus excessos, mas não apela para as facilidades que muitas vezes rondam o teatro para criança.
Se a arte não salva, quem nos salvará de Brasília?