sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Registro 412: Homenagens




Malala Yousafzai

Mais uma texto copiado e colado. Seu autor é MOISÉS NAÍM, e foi publicado em a Folha de S. Paulo (23.11.2012). Comungo com o teor do texto, portanto assino em baixo.Não posso concordar com as aberrações que feriram Malala e Savita. Como não posso concordar com a estupidez do parlamento de Uganda que quer aprovar uma lei brutal: a pena de morte para a homossexualidade. Se eles fizerem isso, milhares de ugandenses poderiam ser executados, apenas por serem gays. Em pleno século XXI não é cabível tais atos, mas diante do fatos, o que fazer? Denunciar. É o que faço publicando o texto de Naím. 

Aproveito a oportunidade para felicitar o Brasil e ao Ministro Joaquim Barbosa. Venceu o mérito. 

Ouviu falar em Malala e Savita?
Moisés Naím

A trajetória dessas duas mulheres ilumina aspectos do mundo em que vivemos neste início de século 21

Malala Yousafzai e Savita Halappanavar. Não é trava-língua. São os nomes de duas pessoas que não poderiam ter menos em comum.

Mas com ambas ocorreram coisas que iluminam aspectos tanto trágicos quanto esperançosos do mundo em que vivemos.

Malala Yousafzai, paquistanesa, 15. Há um mês, quando voltava para sua casa no ônibus escolar, recebeu um tiro que lhe atravessou a cabeça e o pescoço, alojando-se no ombro. Sobreviveu milagrosamente. Seu pecado? O ativismo em favor do ensino para as meninas.

Ao reivindicar o ataque, o Taleban explicou que Malala "é o símbolo dos infiéis e da obscenidade". Quando, em 2009, os talebans controlavam sua cidade, no vale do Swat, Malala começou a escrever um blog. Ela relatava como já não podia ir à escola, o fechamento de muitas escolas e como às vezes os talebans simplesmente as incendiavam. Uma vez que o Exército paquistanês retomou o controle de Swat, Malala se converteu numa voz inteligente em favor da educação das meninas. Para os talebans, essas ideias merecem a morte.

Savita Halappanavar, uma bela dentista de 31 anos de origem indiana, vivia em Dublin. Em princípio, a Irlanda deveria ser menos perigosa para as mulheres que o vale do Swat.

Mesmo assim, um obscurantismo semelhante ao que motivou a tentativa de assassinato de Malala levou à morte de Savita. Grávida de 17 semanas, ela começou a se sentir mal e foi com o marido ao hospital Universitário de Galway. O diagnóstico foi evidente e o tratamento indicado, também. Os médicos concluíram que o feto era inviável.

Desconsolada, Savita se resignou e pediu que realizassem um aborto. "Não podemos", explicaram os médicos. "A lei nos permite fazer abortos apenas quando o coração do feto deixou de bater." Foram forçados a esperar. O coração do feto parou de bater na quarta. E o de Savita, no sábado seguinte.

A autópsia revelou que a causa da morte dela foi infecção generalizada. O marido disse à BBC: "Era nosso primeiro bebê, e ela estava radiante. Não há dúvida de que Savita estaria viva se pudesse ter encerrado a gravidez que a matou."

Por que proteger um feto que é inegavelmente inviável e não tem esperança de vida é mais importante que a proteção de uma jovem mãe de 31 anos com saúde perfeita? Você sabe a resposta. Tanto a tentativa fracassada de assassinato de Malala quanto a morte "por razões legais" de Savita provocaram indignação mundial. Embora isto ainda não seja o suficiente para mudar as coisas radicalmente no Paquistão ou na Irlanda, as duas tragédias tiveram efeitos esperançosos.

Os políticos irlandeses foram forçados a prometer reformar as leis que impediram salvar a vida de Savita. No Paquistão, ficou mais difícil defender a ideia de que as meninas não precisam ir à escola.

Essas mudanças não são suficientes. Mas ao menos as histórias de Malala e Savita lembraram ao mundo que o obscurantismo não é um fenômeno da Idade Média. Está presente e cobra vidas no século 21.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Registro 411: Gostei do texto. Leia

Como você pode ver, o texto não é meu, mas valeu copiar e colar. Como ando com preguiça (mãe de todos os vícios) de escrever, lanço mão do que me agrada, pois me faz pensar.

A fé no progresso

CONTARDO CALLIGARIS


ASSISTI A "Lincoln", o novo filme de Spielberg, no dia da estreia, na sexta-feira passada, numa lotadíssima sessão da tarde, em Manhattan. No Brasil, "Lincoln" chegará só no fim de janeiro.


O filme, que é uma obra-prima imperdível, se concentra sobre o esforço político de Lincoln para que a Câmara dos Representantes ratificasse, em 1865, a 13ª emenda da constituição dos EUA -a que aboliu a escravatura no país.


A escravatura era a aposta central da guerra, que durava havia quatro anos, entre o Norte e o Sul escravocrata. Mas, mesmo no Norte, nem todos eram abolicionistas, e muitos temiam que os negros liberados se tornassem um dia cidadãos e, pasme, pudessem votar.

Ninguém, naquela sala de cinema, na sexta passada, podia evitar de pensar que, três dias antes, o país reelegera seu primeiro presidente negro. Em menos de 150 anos, foi um progresso e tanto.

Falo de progresso só porque essa mudança promove valores nos quais aposto: quando eles avançam, acho que a gente progride. Não acredito na ideia de uma evolução "natural" da civilização (nota para os amigos filósofos: concordo com Voltaire, não com Condorcet, ainda menos com Saint-Simon).


Lembro-me de discussões intermináveis, no fim dos anos 1960, com Nicola, um jovem salernitano que fazia uma pós-graduação em geologia do petróleo em Genebra e que era decididamente anticomunista. A cada almoço, eu e meu amigo Enzo tentávamos convencer Nicola de que o futuro do socialismo seria radioso. Não funcionava.


Um dia, achei um escrito (filosoficamente duvidoso, mas de uma procedência que pareceu confiável a Nicola) segundo o qual, radioso o não, o futuro socialista era inelutável, previsto pelo marxismo "científico". Nicola acreditava na ciência, era ingênuo, e o texto o abalou. Não sei se ele se converteu, mas sumiu do restaurante universitário durante um tempo, e a gente se perdeu de vista.


Bom, Nicola, é um pouco tarde, mas talvez você esteja trabalhando numa plataforma do pré-sal e leia este jornal (o mundo é pequeno, mesmo). Nesse caso, aceite minhas desculpas: o marxismo "científico" é uma ideia calhorda, e o comunismo nunca foi inelutável. Já naquela época, aliás, eu sabia que nada acontece na história sem o engajamento subjetivo dos atores (por isso preferia, por exemplo, Henri Lefebvre a Louis Althusser -e por isso continuo gostando de Alain Badiou, porque ele nunca deixou de pensar que, sem engajamento dos sujeitos, não acontece nada, não há progresso algum).


Tudo isso parece óbvio? Vamos devagar: o sonho comunista pode estar morto, mas nossa (cômoda) crença num progresso "natural" e garantido continua bem viva.


Por exemplo, na semana passada, na eleição americana, junto com a vitória de Obama, aconteceu a derrota de dois candidatos a senador cuja oposição à legalização do aborto (mesmo em caso de estupro) era de um machismo e de uma estupidez ultrajantes. Na mesma eleição, houve também Estados que aprovaram o casamento de pessoas do mesmo sexo.


Nasci e cresci numa Itália em que a desigualdade de fato e de direito era sinistra, e o amparo era pouco. Nesse mundo, as mulheres estavam longe de ter direitos comparáveis aos dos homens, não existia divórcio, qualquer aborto era criminoso, o consumidor de droga era igualado ao traficante, e a homossexualidade era uma vergonha que era melhor esconder.


Para que essas realidades mudassem, lutei -ou seja, junto com muitos outros, votei, escrevi, desfilei, militei. Mesmo assim, tenho a estranha impressão de que fomos carregados por uma espécie de movimento "natural", ao qual era possível resistir, mas que sempre ganharia no fim -um progresso na direção do grande ideal cristão: a maior liberdade possível dos indivíduos sem renunciar à solidariedade.


Essa impressão de progresso "natural" é falsa e perigosa. Na história, nada é garantido: tudo é, sempre, conquistado.


O que nos separa de outros mundos possíveis (e horríveis) não é a inelutabilidade do progresso, mas a obstinação de pequenos grandes gestos. Entre nós e as trevas, há o corpo ferido de Malala Yousafzai, 14, baleada na cabeça pelo Talibã paquistanês porque promovia o "secularismo' (ou seja, queria ir para a escola e pensar com a sua cabeça).


Ou, a coragem da catarinense Isadora Faber, 13, que continua seu "Diário de Classe" on-line, embora hostilizada por professores, por administradores e talvez por um pintor negligente (Folha, 11 de novembro).


Publicado pela Folha de S. Paulo, em 15 de novembro de 2012.