quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Registro 286: Depoimento IX

O jornal O Estado de S. Paulo em seu Caderno 2 - Cultura - sempre aos domingos - apresenta um espaço denominado Antologia Pessoal, no qual profissionais das artes dão o seu depoimento sobre assuntos de sua área. As perguntas não variam, são sempre as mesmas. Ao apropriar-me da idéia, acrescentei uma pergunta e reformulei algumas; basicamente são as mesmas do jornal.Assim, convido artistas baianos ou residentes em Salvador para deixar o seu depoimento no blog Cenadiária. Cada participante indicará um artista para que se forme uma rede de registros e opiniões. Semanalmente, a Cenadiária vai trazer uma personalidade do teatro baiano para o deleito do leitor. Divirta-se.

Lelo Filho, ator, um dos responsáveis pelo grande sucesso do teatro baiano A Bofetada, espetáculo que completou 21 anos em cartaz (2009) e cativa o público por onde passa.

1 – Que atores ou atrizes cujo trabalho em teatro você acompanha?
Admiro muita gente daqui e pelo Brasil afora. O elenco que divide cena comigo em A Bofetada é muito talentoso. Não poderia deixar de citar ainda, Rita Assemany, Yumara Rodrigues, Nanini, Wagner Moura, Chico Anísio, Fernandona, Fernandinha, Marieta e recentemente passei a admirar muito o trabalho e a versatilidade de Andréa Beltrão em cena. E o maior ator de todos os tempos: Paulo Gracindo. É sempre muito bom assisti-lo em imagens.

2 – Que atores ou atrizes de cinema compõem a sua galeria de favoritos?
Jack Lemon é pra sempre. Grande Otelo em Macunaíma e nas comédias da Atlântida é inesquecível. Marília em “Pixote”, Fernandona em “Eles não usam black tie”, Beth Midler em “A Rosa”. Meryl Streep e Daiane Wiest em vários...

3 – Qual diretor de teatro cujo trabalho faz você retornar ao teatro?
Luiz Marfuz e João Falcão.

4 – Dê exemplo de um criador teatral muito bom, mas injustiçado.
É estranho ver o interesse que a mídia e o jornalismo local passaram a ter pelo trabalho de atores baianos que hoje brilham na telinha e na telona. Não me lembro deles terem sido tão festejados quando atuavam, e já eram bons em nossos palcos.

5 – Cite uma criação teatral surpreendente e pela qual você não dava nada.
Assisti Regina Casé em “Nardja Zulpério” e achei que, no máximo, iria ser bacana. Mas me surpreendi e gostei tanto, que acabei voltando pra rever. Era muiiito bom!

6 – A cena baiano-brasileira tem alguns momentos teatrais antológicos. Cite algumas que marcaram sua vida.
Entre o final dos anos 70 e início dos 80, assisti a algumas montagens que muito me ajudaram a decidir pela minha profissão: “Língua de Fogo”, dirigida por Luiz Marfuz, “Macbeth” dirigida por Márcio Meirelles, “Dias felizes” com Yumara e Harildo na Escola de Teatro, dentre muitos outros.

7 – Que encenação lhe fez mal, de tão perturbadora?
As interpretações de Fernanda Montenegro em “Lágrimas Amargas de Petra Von Kant”, de Matheus Nachtergaele em “O livro de Jó” , Jessica Lange no palco como Blanche em “Um bonde chamado desejo”, Walderez de Barros em “Max” e Marília Pêra em “Brincando em cima daquilo” foram arrebatadoras. Montagens e atuações marcantes na minha vida pessoal e artística.

8 – Que espetáculo teatral mais o fez pensar?
“O Livro de Jó”, pelas interpretações e pela temática.

9 – Comédia é um gênero de segunda?
Ninguém vive sem humor. Até quem torce o nariz pra comédia. O riso é fundamental, assim como a comédia, em todas as suas vertentes.

10 – Cite uma peça difícil, mas significativa.
A obra de Nelson Rodrigues é maravilhosa, mas também é complexa. Fui Edmundo em “Album de Família” e acho um dos textos mais difíceis que já li.

11 – Cite uma encenação que imagina ter sido memorável e você não viu.
Quis muito ter visto “Os sete afluentes do Rio Ota”. Ouvi maravilhas sobre o espetáculo.

12 – Uma encenação difícil, mas inesquecível.
“O Pai”, de Strindberg e dirigida por Márcio Meirelles.

13 – Que texto(s) escrito(s) nos últimos dez anos merecia um lugar na história do teatro brasileiro?
Espero que “Siricotico”, ainda inédito, venha a merecer! Será a nova montagem da Cia Baiana de Patifaria.

14 – Qual o texto dramático clássico brasileiro, de qualquer tempo, você recomendaria encenações constantes?
Não assisti, mas tenho a trilha sonora de “Gota D’Água”, com Bibi Ferreira cantando e interpretando alguns textos do espetáculo. Queria muito que fosse remontado.

15 – Cite um(a) autor(a) sempre ausente dos cânones que merece seu aplauso?
Vinnicius Morais, co-autor de “Siricotico” e autor de textos divertidíssimos e que são a cara do nosso povo. Com certeza será reconhecido pelo público como um jovem e talentoso autor.

18 – Que montagem (ou ator, autor, diretor, cenógrafo, figurinista, iluminador) festejado pela crítica você detestou?
Assistir a mais de uma montagem de Denise Stoklos e Gerald Thomas me deu a sensação de déjà vu. A primeira você não esquece, as outras você sai com a sensação de que já assistiu. As encenações parecem reprise.

19 – E que montagem (ou ator, diretor, autor) demolida por críticos você gostou?
Não me recordo.

20 – Qual peça e personagem gostaria de fazer? Você pode citar três.
Um dos personagens de Beckett, especialmente de “Fim de Jogo” e “Esperando Godot”. Gostaria de voltar a fazer um texto de Nelson Rodrigues.

21 – Que virtude você mais preza no teatro de qualidade?
A comunicação. Seja no drama, na comédia ou na tragédia. Não imagino teatro que não se comunique, que dialogue com a platéia, que diga alguma coisa.

22 – O que mais incomoda você no mau teatro?
Não gosto da pretensão. Principalmente se for de um teatro mal realizado.