sexta-feira, 4 de junho de 2010

Registro 310: Diga não às drogas. Diga mesmo!

O poeta Ferreira Gullar sempre acerta em seus textos publicados aos domingos na Ilustrada, um dos cadernos do jornal Folha de S. Paulo. Este que transcrevo aqui é de uma lucidez impressionante. Esqueci de registrar a data da publicação. Nele, o poeta trata de um tema preocupante, a desgraça do tráfico e de quem o alimenta. Ele nos chama para a real e nos coloca diante da nossa omissão. Somos omissos por que aceitamos os consumidores sociais da droga, um número bastante grande em todas as camadas da população brasileira, principalmente nas classes mais abastadas. É esse usuário irresponsável o incentivador o mercado. Tenho a seguinte opinião: por trás do traficantes existem pessoas poderosas e importantes no cenário nacional e internacional. E por isso, penso eu, o malefício se alastra como um rastilho de pólvora. Gullar nos fala também sobre os dependentes, um caso de saúde pública. Seu texto é uma alerta e deve ser lido em todos os lugares. Essa é a minha intenção: divulgá-lo. Leia. pense e tome uma atitude. Houve um tempo, lá pelos idos do 60 e 70 que os jovens não queriam ser rotulados de caretas e por esse motivo, muitos deles passaram a consumir drogas. Outros, usaram as substâncias visando a expansão da consciência e ampliar a sua capacidade criativa, outros brincaram. Alguns se deram bem, outros se perderam. Mas vivíamos tempos bem diferentes dos de hoje. A violência era de outra ordem. Hoje, sou mais pela caretice, mano!

QUEM MANTÉM O TRÁFICO É O USUÁRIO

Ferreira Gullar


Só uma operação em larga escala, que envolva famílias, escola e Estado, poderá deter o avanço da droga


SEI QUE o combate às drogas é um assunto polêmico e realmente de difícil solução. Sei também que as pessoas que se empenham nesse combate estão de boa-fé e convencidas das posições que defendem.

Um dos pontos mais difíceis de abordar é a repressão ao usuário de drogas, que é visto não como um contraventor, mas como uma vítima da dependência química.

De fato, não teria sentido tratar o viciado, que não consegue livrar-se da droga, do mesmo modo que o traficante, que se vale disso para ganhar dinheiro. Não obstante, me pergunto se todos os que consomem drogas são efetivamente dependentes, sem condição de livrar-se delas.

Já abordei aqui este assunto, quando usei do seguinte argumento: assim como a maioria dos consumidores de bebidas alcoólicas não é constituída de alcoólatras, também a maioria dos consumidores de drogas as consome socialmente.

Em grande parte, é gente de classe média alta e até mesmo executivos. Não podem ser vistos pelas autoridades do mesmo modo que os consumidores patológicos.

Este é um aspecto importante a ser considerado no combate às drogas, uma vez que o consumidor é o fator decisivo para a manutenção ou extinção do tráfico: não haverá comércio de drogas se não houver quem as compre. Sem consumidor, não há produção nem mercado.

Insisto neste ponto porque, como disse acima -e todos o sabem- será impossível extinguir o tráfico (e mesmo reduzi-lo drasticamente) se o número de consumidores se mantiver alto. E o fato é que o consumo de drogas cresce de ano para ano.

Se se admite, portanto, que é o consumidor quem garante a existência e expansão do tráfico, não resta dúvida de que é nele -no consumidor- que reside a chave do problema.

Atualmente, prepondera o combate direto ao tráfico, de que resulta uma verdadeira guerra, travada, quase sempre, nos subúrbios e nas comunidades pobres, que enfrentam grandes dificuldades para se manter e a suas famílias, e pagam alto preço pelas consequências dessa guerra.

E ao que tudo indica, com poucos resultados positivos. O tráfico continua a se expandir, envolvendo em suas malhas jovens cada vez mais jovens e até mesmo crianças cooptadas em suas escolas.

Paremos para refletir: se é o consumidor que mantém o comércio de drogas, não é evidente que o modo efetivo de combatê-lo é reduzir progressivamente o número de consumidores?

O erro cometido até aqui -se não me equivoco- terá sido reprimir tanto o traficante quanto o usuário de drogas, sem distinguir entre estes os que se drogam por necessidade patológica e os que o fazem socialmente. Mas, de qualquer maneira, a simples repressão, tanto ao usuário quanto ao traficante não resolverá o problema.

Por estar convencido disso, proponho que se encare essa questão a partir do consumidor, ou seja, impedindo que o número destes continue a crescer e, mais que isso, tentar reduzi-lo progressivamente.

Talvez as pessoas, que ainda não refletiram seriamente sobre o problema, tenham dificuldade de considerá-lo em sua verdadeira dimensão.

Sem exagero, a droga, como fenômeno mundial, pode ameaçar a própria civilização, já que se vale da juventude, isto é, daqueles que amanhã terão a sociedade em suas mãos.

Afora isso, a simples destruição de uma vida ou de uma família já justificaria todo o esforço possível para resolver tal problema. Por essa razão mesmo, acredito que o objetivo principal da luta a ser travada é manter os jovens e as crianças fora do alcance do traficante.

Estou convencido de que só uma operação em larga escala, que envolva não apenas as famílias, mas também a escola e os órgãos do Estado, poderá deter o avanço da droga. Não se trata de simplesmente promover uma campanha de esclarecimento, acreditando que isso seria suficiente. Não o seria.

Trata-se, a meu ver, de um trabalho permanente a ser desenvolvido por todos os setores da sociedade, devidamente organizado e mantido, evidentemente, pelo governo, com a participação da sociedade.

Um trabalho de reeducação e esclarecimento em caráter permanente, visando o futuro, mas implantado depois de muita reflexão e cuidadosamente elaborado. Tarefa para os novos governantes.