sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Registro 420: Ciclo de Leituras Dramáticas


UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
ESCOLA DE TEATRO
GRUPO DE PESQUISA DRAMATIS

APRESENTAM

CICLO DE LEITURAS DRAMÁTICAS DA UFBA

NOVA DRAMATURGIA – BARRA 69


Por volta de 1968 aparece na cena brasileira, principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro, mas não se restringindo a estes lugares, uma geração de dramaturgos inaugurando uma tendência inovadora: José Vicente, Leilah Assumpção, Antônio Bivar, Consuelo de Castro e Isabel Câmara, os autores mais representativos.

Uma das características imediatamente visíveis nos textos é o viés autobiográfico, apresentado por meio da linguagem despojada das regras literárias articuladoras da dramaturgia que se fazia até então. O forte acento confessional singulariza a produção dos textos, tornando-os bem diversos da produção dramatúrgica posta em movimento pelos Seminários de Dramaturgia do Teatro de Arena de São Paulo iniciado em 1958, de forte acento político e social.

Antônio Bivar, Consuelo de Castro, Isabel Câmara, Leilah Assumpção, Isabel Câmara e Zé Vicente afastam-se dos temas e das formas trabalhadas pelos autores que produziram uma dramaturgia engajada, voltada para a discussão dos problemas sociais. Tomando outro rumo, os jovens autores optam pelo confessionalismo, instaurando o poético e o político por outro viés. Estão em cena, não mais os personagens como o favelado, o vaqueiro, o retirante, o operário, entre outros, mas aqueles oriundos da classe média urbana que perde o rumo diante dos acontecimentos nacionais e internacionais.

É sabido que a finalização da década de sessenta é plena de reviravoltas: questionam-se hábitos, costumes, posicionamentos políticos e estéticos. Em meio ao ambiente contracultural, o Brasil vive o auge repressivo do governo civil-militar. Assim, os personagens criados pelos novos autores espelham a situação daquele momento.

Ao longo do tempo, boa parte da dramaturgia deste Ciclo de Leituras Dramáticas da UFBA foi esquecida. Ainda que Zé Vicente receba a atenção dos encenadores no presente, Leilah Assumpção e Consuelo de Castro continuem produzindo para o palco, Antônio Bivar, um dos participantes mais transgressores do grupo, já não escreve para o teatro. Isabel Câmara completa o quadro que comporta também Carlos Alberto Soffredini, Mário Prata e o baiano Ariovaldo Matos.

Seis textos compõem o Ciclo de Leituras Dramáticas – Nova Dramaturgia Barra 69: O Assalto, de Zé Vicente (Direção Harildo Déda), Fala Baixo Senão Eu Grito, de Leilah Assumpção (Direção Ewald Hackler), O Desembestado de Ariovaldo Matos (Direção Sérgio Nunes Melo), As Moças, de Isabel Câmara, (Direção Elisa Mendes), À Flor da Pele, de Consuelo de Castro (Direção Eliene Benício), Cordélia Brasil, de Antônio Bivar (Direção Celso Nunes).

A escolha dos textos baseia-se na importância que tiveram quando levados ao palco e por conterem elementos que dialogam com o presente. Ao serem revelados, os autores receberam a atenção da crítica e do público, atraídos que foram pelas abordagens existenciais levadas à cena de maneira violenta, cruzando-se aspectos autobiográficos e os ficcionais, figuradores dos impasses de uma geração cerceada pela situação política brasileira. São textos cuja potência não diminuiu e são merecedores de novas leituras.

Não haverá cobrança de ingresso. Para os espectadores que assistirem três leituras do Ciclo será fornecido um certificado.
PROGRAMAÇÃO
O ASSALTO
Zé Vicente
DIREÇÃO
Harildo Déda
ELENCO
Nando Zâmbia, Vinícius Martins,
Patrícia Oliveira
TEATRO MARTIM GONÇALVES
26 de fevereiro, 18:30
**************
FALA BAIXO SENÃO EU GRITO
Leilah Assumpção
DIREÇÃO
 Ewald Hackler
ELENCO
 Joana Schnitman, Osvaldo Baraúna, 
Evana Jeyssan
TEATRO MARTIM GONÇALVES
27 de fevereiro, 18:30
**************
O DESEMBESTADO
Ariovaldo Matos
DIREÇÃO
Sérgio Nunes Melo
ELENCO
Newton Olivieri, Ana Tereza, Thiago Carvalho
Larissa Raton

 TEATRO MARTIM GONÇALVES
05 de março, 18:30

***************
 AS MOÇAS
Isabel Câmara 
DIREÇÃO
Elisa Mendes
ELENCOMárcia Andrade
 Laura Sarpa; 
Amauri Oliveira
TEATRO MARTIM GONÇALVES
06 de março, 18:30

***********
À FLOR DA PELE
Consuelo de Castro
DIREÇÃO
Eliene Benício
ELENCO
Eveline Ferraz, Raimundo Matos de Leão
Marcos Moreira
TEATRO MARTIM GONÇALVES
12 de março, 18:30

**************
CORDÉLIA BRASIL 
Antonio Bivar
DIREÇÃO
Celso Nunes
ELENCO
Jacyan Castilho, Marcelo Praddo, Saulus Castro
Antonio Fábio
TEATRO MARTIM GONÇALVES
13 de março, 18:30

****
Coordenação do Ciclo de Leituras
Raimundo Matos de Leão
Joana Schnitman

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Registro 419: Mais uma vez Cachoeira


Mais um dia cachoeirano. Sábado (09.02,2013) de andanças pela cidade, suas ruas estreitas, ladeiras íngremes, casarões, os mais belos, alguns cuidadosamente conservados, outros nem tanto. Que belo seria se a população como um todo tivesse condições de preservar seu patrimônio. Ainda assim, é notável o cuidado com que muitos moradores tratam suas moradas. Fomos visitar outra benzedeira, ou rezadeira, como queira o leitor. Dona Odete mora numa casa humilde na lateral da Igreja do Rosarinho, perto do cemitério destinado aos negros, sítio restaurado na gestão de Gilberto Gil no Ministério da Cultura. Perto também do cemitério dos alemães. Na última vez que estivemos (2012) aqui, o cemitério estava completamente abandonado, mas soube que havia um projeto de resaturo que se arrastava pelas confusas redes burocráticas. Soube também que não havia tanto interesse por ser um sítio destinado a enterrar brancos, uma atitude maléfica desencadeada por esta política equivocada que tenta impor um padrão norte-americano entre nós, ou seja, dividir uma nação miscigenada em brancos de um lado e negros do outro. Reafirmo aqui que sou totalmente contra a tal política. Reafirmo também o meu posicionamento contra ao preconceito e contra a falta de oportunidades para os pobres desta terra Brasilis. É certo que vivemos numa sociedade extremamente preconceituosa, mas não apartada.

Mas voltemos ao foco do registro, a visita que fizemos a Dona Odete, simplicidade visível no viver. Atitude acolhedora se mostra imediatamente e se amplia à medida que se quebram as barreiras proporcionadas pelo desconhecimento, tanto de um lado quanto do outro. Ela nos benzeu e disse ao meu amigo que ela estava muito carregado, puro mau olhado. Não comentou nada a meu respeito, mas rezou-me com a sabedoria dos antigos, conhecedora que é da bondades e das maldades deste mundo. A visita se encerrou com abraços.

Em seguida fomos a São Félix em busca de uma senhora fazedora de bonecas de pano, uma indicação da funcionária da Pousada. Rodamos sem encontrar o destino, até que alguém nos indicou a casa da irmã de Dona Noêmia. Gentilmente, a irmã no levou até a bonequeira, artesã de primeira. Para nossa surpresa de habitantes de cidade grande, a receptividade da senhora revelava uma outra maneira de ver o mundo, de conviver. Ainda que soubesse da violência do mundo distante e também do próximo, ela nos recebeu em sua casa, uma típica construção do começo do século XX, com seu longo corredor que dá acesso às salas. Por elas passamos para a varanda ladeada pelo estreito quintal com plantas exuberantes. Dona Noêmia nos mostrou algumas das suas bonecas, mas não tinha exemplar para venda.

Retornamos a Cachoeira em busca de outra senhora que nos indicaram como artesã de bonecas, mas não encontramos sua casa. Deixamos então para o domingo de carnaval. Fomos convidados para ir até Maragojipe para ver os blocos de mascarados, no meu tempo de menino chamados de caretas. Declinamos, pois tínhamos outros planos: descansar refrigerados pelo ar condicionado.

No domingo, conseguimos chegar até a casa de Dona Anita, mas ela não estava. Passamos mais uma vez no atelier de Mimo e adquirimos mais uma peça.

Antes de dormir, uma olhada no desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Um horror. Estúpidos enredos, megalomania dos carnavalescos, tecnologia em vez de criatividade. Uma pena.

Segunda pela manhã, retornamos para tentar encontrar Dona Anita. Ela nos recebeu atenciosamente e saímos de lá com duas bonecas de pano, bonecas de feitio tradicional, tal qual as que eram vendidas na feira livre de Ipirá. As minhas irmãs brincaram com bonecas de pano que vão perdendo lugar para as de plástico feitas em série e sem muitas surpresas. Passamos mais uma vez pela praça e encontramos Davi, o pintor e Seu Zé, o fotógrafo. Um dedo de prosa na manhã ensolarada de céu azul bordado por nuvens brancas.

Lendo a Folha de de S. Paulo, edição de hoje, segunda-feira, li a entrevista de João Jorge Rodrigues, do Olodum sobre o carnaval soteropolitano. Embora discorde de alguns pontos, a sua fala é lúcida e coerente. Recortei o seguinte trecho:


"Folha de S. Paulo: - O chamado 'Afródromo' ajuda ou atrapalha o cenário? [a iniciativa de Carlinhos Brown e outras seis entidades de criar um novo circuito, exclusivo para os blocos afro, estrearia neste ano, mas foi adiada pela nova gestão na prefeitura]

João Jorge - O Olodum tem brigado muito para sair mais cedo e poder ser visto pela televisão. Para que empresas patrocinem de forma equitativa os blocos afros.

Ao mesmo tempo, eles resolveram fazer algo separado. O que a sociedade mais quer é que os negros escolham um gueto para ir e se afastem da disputa com eles. É como se soubéssemos o lugar em que deveríamos ficar, em vez de aparecermos na Barra, no Campo Grande.

Mais ainda: obriga o poder público a ter gastos com outro circuito, quando os recursos poderiam ser distribuídos de uma forma melhor".

Não sei se é o que quer a sociedade. Generalizar é radicalizar. Não concordo com a ideia de se criar o tal circuito já denominado de "Afródromo". Mais um absurdo nos absurdos baianos. Sou do tempo que o carnaval era a atração e as personalidades, os famosos, brincavam na rua junto com os foliões. Era reconhecidos, às vezes aporrinhados por fãs afoitos, mas estavam na rua, ali na Praça Castro Alves, na famosa escadaria, dançando e se divertindo. A mesmice tomou conta do circuito Barra-Ondina, tudo igual, repetitivo e chato. É certo que o carnaval passaria por transformações, mas elas aconteceram de cima para baixo. O poder público em conluio com o poder privado, incluindo os artistas, impuseram o modelo que está aí. Só quero ver quando a coisa não funcionar mais? Qual será a proposta urdida nos gabinetes. Mataram o carnaval no Centro, confinaram parte da festa no Centro Histórico. Fazem o mesmo com o circuito do Campo Grande que perde o interesse para as redes de televisão. Tudo se volta para o circuito "nobre", Barra-Ondina. Até quando? A força da grana determina tudo e o povão vai na onda.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Registro 418: Diário de Cachoeira, mais um dia...


Pela janela da antiga cela, hoje um dos bons apartamentos da Pousada do Convento do Carmo, vimos uma construção, mas não das antigas. De qualquer maneira, o interesse por ela fez com que saíssemos sem destino, mas com vontade de ver de perto o imóvel. Depois de íngreme ladeira, a rua terminava no topo do morro e não havia com seguir de carro. Estacionamos em frente a uma casa pintada de azul, muito simples, mas bem cuidada. Da casa saiu um dos seus moradores. Reconheci o moço que pintava a Pousada no dia da nossa chegada. Ele também nos reconheceu e nos levou para conhecer o imóvel, um antigo hospital para crianças, atualmente uma creche.

Do alto do morro, a vista da cidade é memorável. Fotografamos e entabulamos conversa com Caetano, o moço que nos recebeu. Ele mostrou a construção que está fazendo no terreno que lhe pertence. Interessamo-nos por plantas e ervas do terreno e ele foi identificando cada uma delas com sabedoria adquirida pela vivência: aroeira, vassourinha, mastruz, velame, jurubeba, entre outras. Uma serigueleira carregada de frutos ainda verdes chamava a atenção. Agradecidos pela gentileza, descemos a ladeira e seguimos o passeio para os lados da Santa Casa de Misericórdia.

Antes do almoço, fomos mais uma vez dar uma volta na praça em frente ao Paraguaçu. Em torno do monumento que homenageia as lutas pela Independência da Bahia, movimento resistente começado em Cachoeira, havia uma exposição de fotos de Seu Zé e de pinturas de Davi Rodrigues. Adquirimos duas pinturas em papel e uma foto e logo nos entrosamos. O cidadão cachoeirano é receptivo e conta orgulhosamente sobre a cidade, sua vida cultural e artística. Davi Rodrigues foi premiado na Bienal do Recôncavo, agraciado como artista da região. Sua pintura de temática fortemente marcada pela religiosidade sincrética de Cachoeira, se expressa formalmente por uma variedade cromática rica em detalhes obsessivamente trabalhados, remetendo ao pontilhismo. Ex-aluno de Hansen Bahia, o pintor iniciou seu trabalho como gravador, mas enveredou para a pintura, visto que os quadros despertavam mais interesse.

Na frente da exposição, ou seja, do monumento uma manifestação religiosa acontecia. Um terreiro de umbanda realizava culto em praça pública homenageando Oxum ou Iemanjá. Certamente Oxum,visto que o rio de águas doces banha a cidade. É possível que a cerimônia era para a Rainha das Águas. Um balaio com flores aguardava o momento de ser levado até o rio. Atraídos pelo evento aproximamo-nos respeitosamente e acompanhamos com palmas os pontos cantados pelos filhos e filhas do terreiro, muito deles em transe.

Depois do almoço visitamos o atelier de Mimo, escultor. Adquirimos quatro peças entalhadas na madeira, quatro pequenos Orixás.

Amanhã tem mais...

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Registro 417: Diário de Cachoeira - Bahia


Há três anos, fugimos do Carnaval soteropolitano para o descanso em Cachoeira, uma das cidades mais lindas da Bahia. Aqui me sinto bem. O tempo escorre com suas ladeiras e ruas num traçado original, com seus casarões centenários, seus cantos e seu rio. Cachoeira é uma cidade potencialmente rica para o turismo. Mas espero que não seja um turismo predatório. Chegamos na quarta-feira (06.02.2013) depois de viagem tranquila. Passamos por Santo Amaro percorrendo as suas ruas principais. Logo depois, seguindo as curvas da estrada, descemos até a Heroica  como todos os cachoeiranos a conhecem. Mais uma vez, desfrutamos do conforto da Pousada do Convento do Carmo. Os padres sabiam morar. A bela construção, necessitando de mais cuidado, é imponente. Para quem quer descansar um ótimo lugar. Imagino com teria sido a vida por aqui quando o lugar era habitado pelos Carmelitas. Não entrarei no mérito da ação destes frades na região. O que importa para mim é o patrimônio, deixado, retrato de um passado, cujo tempo e a ação do homem, nem sempre responsável, não destruíram, embora haja muita ruína em Cachoeira. O passado se apresenta a todo instante em “seus milhões de instantes já vividos e que permanecem presentes enquanto deles persistir uma lembrança ou um efeito”, como nos diz Marguerite Yourcenar em seu livro A Volta da Prisão (1992, p. 4).

Andando pelas ruas, ficamos sabendo que seria realizada a Quarta dos Tambores, evento em praça pública. Às vinte horas estávamos na praça em frente ao rio, o Paraguaçu. A programação foi aberta com um grupo de ogans. Eles tocaram e cantaram cantigas em louvor aos Orixás da nação dominante em Cachoeira, a Jêje. Uma senhora vestida de branco também cantou e dançou no meio da grande roda. Um bom público foi se formando. Em seguida apresentaram-se grupos de samba-de-roda. O primeiro deles, Esmola Cantada revelava as confluências entre o sagrado e o profano. Segui-se a apresentação dos Filhos do Caquende e dança esquentou ainda mais. Os espectadores, homens e mulheres, dançavam divinamente, com elegância, ginga, sensualidade e domínio do passo e do espaço. Impressionante a habilidade dos pares e de todos que arriscavam expressar o samba no pé. Samba no pé e nas vozes que desfiavam os mais lindos e tradicionais sambas, alguns conhecidos outros não. Uma noite inesquecível. Não arrisquei uns passos, para não passar vergonha. Tenho o quadril sem molejo, condição necessária para a execução da dança.

Na quinta, fomos a uma rezadeira que com galhos de aroeira nos rezou. Seguindo a tradição iniciada por seu pai, um famoso beato de Cachoeira. Deixei na folhas as mazelas e saí da casa da rezadeira sentindo-me leve. Lembrei-me da infância quando Davina, rezadeira das boas em Ipirá, rezava os filhos de Dona Ester e de seu Roque.

Um incidente na manhã calorenta. Da última vez que estivemos na cidade, a matriz estava em processo de restauro e por isso mesmo fechada. Agora, com as obras concluídas, a Igreja do Rosário encontrava-se aberta aos seus fiéis e visitantes. Resolvemos entrar para apreciar o templo. Pretendíamos assistir à missa e em seguida fotografar o belo espaço. As fotos deveriam compor o blog Igrejas da Bahia, hoje contendo imagens de cinquenta igrejas de Salvador, incluindo a Igreja da Ordem Terceira do Carmo de Cachoeira, cuja decoração nos deixa extasiado. Pois bem, fomos proibidos de fotografar a Igreja do Rosário com a alegação de que o templo tinha sido roubado várias vezes. Sentimo-nos ofendidos, visto que fomos, de certa forma, acusados de sermos ladrões de igreja. O mais estranho é que tal medida tenha sido tomada depois que levaram a grande maioria das imagens. Presumo que as mesmas devam ser lindas e devem estar decorando alguma residência brasileira ou estrangeira. Feita a proibição nos retiramos. Antes, porém, nós protestamos. 

Um templo deve ser cuidado por seus responsáveis, mas não se pode proibir de fotografá-lo, desde que a máquina esteja adequada para tal função, sem flash, e não agrida os elementos decorativos nem as cerimônias religiosas e seus fiéis. Quanto a isto, estamos de acordo. Depois do sucedido, pensando cá com meus botões, dei-me conta de que a Arquidiocese e as Ordens Religiosas não botam um prego no seu patrimônio. Alegam determinações do Instituto do Patrimônio. Não botam prego, ou seja, não dão à mínima. Basta ver como ficou, por exemplo, o conjunto arquitetônico de São Francisco do Iguape, região perto de Cachoeira. É certo que o Instituto deve cuidar para que se mantenha o estilo de cada igreja, suas imagens, seus elementos decorativos, para que tudo isto não seja modificado aleatoriamente por pessoas que desconhecem a história da arte, ou sem a mínima sensibilidade para olhar o espaço e ver que não se pode inserir coisas conflitantes com a estética impressa pelos construtores das belas igrejas da Bahia e o Brasil. O mais sério de tudo é que este belíssimo patrimônio, independente da religião e da fé, é restaurado com verbas públicas. Portanto, somos nós, crentes e ateus, que destinamos o dinheiro recolhido pelos impostos para o restauro e a conservação dos edifícios, sejam eles igrejas, museus e outros. 

Não incorrendo em acusações, o certo é que os responsáveis pelas igrejas, ou seja, os padres, não estão nem aí. Não quero generalizar, mas é sabido que muitos deles dilapidam o patrimônio. Todos nós sabemos que tal acervo é cobiçado por colecionadores ávidos de botarem a mão nas ricas obras. Ladrões são muitos e de várias procedências... Não é o nosso caso. Podemos ser acusados de capturar os bens através das fotos, uma apropriação, mas que não causa dano ao patrimônio. Deixo aqui o meu protesto. Ah, além do mais, num época propícia ao turismo - a Pousada não me deixa mentir, visto seu bom número de hóspedes brasileiros e estrangeiros -, as igrejas de Cachoeira estão toda fechadas. E não somente elas. Tudo que pertence ao poder público também. Assim fica difícil manter viva está acolhedora e bela cidade que é Cachoeira, um poema entre morros, banhada pelo grande rio Paraguaçu, onde já não navega o vapor.

A sexta-feira amanheceu ensolarada. Depois do mergulho na piscina da pousada, fomos para São Félix, a vizinha cidade do outro lado do Paraguaçu. Queríamos ver a Bienal do Recôncavo em sua décima primeira edição, uma realização do Centro Cultural Dannemann.  Gostei do Centro e da Bienal. Não vou me deter nos trabalhos da mostra, são muitos; Mas não posso deixar de citar o de Flora Rebollo, os desenhos da Série Cortina Vermelha: Chapéu Mosquiteiro e Interior de Chapéu. A artista recebeu merecidamente, o grande prêmio. Da montagem, o único reparo é a cor dos painéis. As cores berrantes concorrem com muitas das obras. O Centro Cultural abriga uma sala onde um grupo de mulheres muito bem acomodadas em mesas enrolam charutos. Dannemann é uma fábrica de charutos. O resto do dia foi de passeio, fotos e depois muita preguiça.