Ontem (04.12.2009), dia da padroeira das tempestades, de calor intenso e muita luminosidade, deparo-me na edição de A Tarde com uma carta em defesa da Marcha da Maconha. Nada contra. Marcha-se por tanta coisa, umas até indefensáveis! Outra nem tanto. O meu espanto não é fruto nem da Marcha nem da carta. Mas através dela fico sabendo que o sociólogo Renato Cinco estabelece uma relação entre a repressão ao tráfico como sendo uma questão abolicionista, ou melhor antiabolicionista, visto que para ele, os perseguidos, pessoas ligadas ao tráfico, são "negros" e "pobres". Por serem negros e pobres são vítimas do preconceito e a perseguição se dá por essa condição. Penso ser uma distorção. Não me parece que o tráfico esteja associado a essa ou aquela etnia nem é uma questão de classe. Se a contravenção está instalada nas regiões onde se encontram moradores de baixa renda, não podemos sair em defesa da criminalidade por conta da pobreza e de serem negros o contrataventores. O tráfico também se instala em outras camadas da sociedade e o problema deve ser atacado do ponto de vista da criminalidade, seja ela conduzida por qualquer pessoa. Não sendo assim, instala-se a barbárie! O que se persegue não são negros e pobres, assim me parece, mas contraventores, "comerciantes" ilegais de drogas, algumas delas mortais. E essa ação não fica circunscrita ao ciclo de venda e consumo, não necessariamente nessa ordem. O comércio ilegal na mão de brancos ou negros, leva a um ciclo de horror derivado da violência gerada por esse ambiente. O posicionamento do sociólogo escamoteia, desvia e tenta criar uma falácia. Depois, quando se diz que a sociologia serve para tudo e não serve para nada, desperta-se o furor dos sociólogos de plantão. Mas teses estapafúrdias como estas causam espanto e são perigosas. Não creio que a luta para vencer o preconceito e incluir passe por essa ótica. Não creio que tal tese amplie a discussão sobre a legalização das drogas, assunto complexo que não deve ser discutido por esse viés. Essa visão idealizada do povo não faz avançar as suas questões nem contribui para o processo transformador. A que ponto nós chegamos!
2 comentários:
Acredito que a posição de Renato Cinco seja uma alusão a um período histórico, alí nos idos dos anos 20, quando o uso da maconha era comom às comunidades camponesas de afro-descendentes e o governo, como tática de controle de evasão desses indivíduos aos meios urbanos, lançou campanhas contra o uso da erva. Chegava-se ao ridículo de atribuir à planta a causa por características que eles entendiam ser típicas do povo negro, tais como preguiça, agressividade e revolta. Vale lembrar que a maconha foi criminalizada no Governo Vargas, justamente quando explodiu o fenômeno migratório.
Todavia, é obvio que hoje em dia vivemos um outro quadro e o consumdo da maconha transcendeu a religião, a cultura, o folclore... já não cabe esse tipo de argumento para reforçar o debate em torno tanto da descriminalização da maconha quando do racismo.
Inclusive, a difusão do tráfico e essa explosão que vivemos hoje, e que é problema sério de segurança pública, tem origem num outro ato desastroso do Estado, quando em meado nos anos sessenta foi proibido o cultivo da maconha em qualquer circunstância. Ora, a prática comum até então era o usuário plantar a folha para o próprio consumo e ao proibir isso o governo criou o terreno perfeito para o mercado negro - o Tráfico, que se instalou a partir dos anos 70.
Hoje em dia está voltando ao debate a questão do cultivo pessoal como tática de combate ao tráfico.
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