sexta-feira, 6 de março de 2009

Registro 245: Depoimento IV

O jornal O Estado de S. Paulo em seu Caderno 2 - Cultura - sempre aos domingos - apresenta um espaço denominado Antologia Pessoal, no qual profissionais das artes dão o seu depoimento sobre assuntos de sua área. As perguntas não variam, são sempre as mesmas. Ao apropriar-me da idéia, acrescentei uma pergunta e reformulei algumas; basicamente são as mesmas do jornal.Assim, convido artistas baianos ou residentes em Salvador para deixar o seu depoimento no blog Cenadiária. Cada participante indicará um artista para que se forme uma rede de registros e opiniões. Semanalmente, a Cenadiária vai trazer uma personalidade do teatro baiano para o deleito do leitor. Divirta-se.

JORGE ALENCAR

Criador em teatro e dança. Diretor artístico do grupo Dimenti (Salvador - Bahia - Brasil) desde 1998. Comunicólogo pela Universidade Católica do Salvador, Licenciado em Dança e Mestre em Artes Cênicas pela Universidade Federal da Bahia.

1 – Que atores ou atrizes cujo trabalho em teatro você acompanha?
Além dos artistas com os quais eu trabalho há quase onze anos no Dimenti, há atores e atrizes baianos que constam em minha bibliografia: Rita Assemany, Cristiane Mendonça, Marcelo Prado, Lúcio Tranchesi, Evelin Buchegger, entre outros que a memória e o espaço injustamente omitiram.

2 – Que atores ou atrizes de cinema compõem a sua galeria de favoritos?
Vamos ao Olimpo nacional: Marília Pêra, Fernanda – mãe e filha, José Dumont, Marcélia Cartaxo...

3 – Qual diretor de teatro cujo trabalho faz você retornar ao teatro?
Focarei nos que atuaram na Bahia: Harald Weiss, Fernando Guerreiro, Hebe Alves, Carmem Paternostro, José Possi Neto, João Falcão, Luiz Marfuz – são alguns dos que grudaram em mim desde tenra idade quando comecei nos tablados.

4 – Dê exemplo de um criador teatral muito bom, mas injustiçado.
(Risos). Será que eu sou bom? Sei que, mesmo com uma produção ininterrupta há bons anos, nunca recebi uma indicação sequer no prêmio local de teatro. Ai de mim!!

5 – Cite uma criação teatral surpreendente e pela qual você não dava nada.
Lembro de Barba Azul de Márcio Meireles. Mesmo sabendo da competência de Márcio, na época fui desmontado assisti apenas a um espetáculo feito na sala João Augusto (uma sala de ensaio!) com um elenco com muitos jovens atores. A peça tinha soluções bem inteligentes. Houve também uma peça despretensiosa que voltei para assistir: Pelo Telefone com Cristiane Mendonça e Ricardo Castro – leve e agradável como uma brisa da praia da Barra - bairro onde o trabalho era apresentado.

6 – A cena baiano-brasileira tem alguns momentos teatrais antológicos. Cite algumas que marcaram sua vida.
Posso indicar obras dos diretores que citei acima: Ade Até, A Bofetada, O Homem Nu: suas viagens, Merlin ou A Terra Deserta, A Casa de Eros, A Ver Estrelas, O Casamento do Pequeno Burguês.

7 – Que encenação lhe fez mal, de tão perturbadora?
Da safra recente: Ensaio. Hamlet da Cia. dos Atores. Perturbadora e me fez muito bem.

8 – Que espetáculo teatral mais o fez pensar?
Não sou corajoso o suficiente para eleger um espetáculo apenas. A lista acima dá pistas.

9 – Comédia é um gênero de segunda?
De primeira. Estudei sobre comicidade em meu mestrado e produzo peças com humor. É um gênero que sofre muitos preconceitos, já que é quase sempre visto como algo frívolo, pueril e pouco profundo pelas “vozes oficiais” e mal humoradas.

10 – Cite uma peça difícil, mas significativa.
Adoro algumas “peças difíceis”, sobretudo em relação à maneira como produz significados na cena, que solicitam a co-autoria do público. Tenho um pouco de preguiça com peça que se preocupa em passar “uma mensagem”, teatro não é SMS.

11 – Cite uma encenação que imagina ter sido memorável e você não viu.
The Flash and Crash Days de Gerald Thomas. Assisti a fragmentos em vídeo.

12 – Uma encenação difícil, mas inesquecível.
Ade Até foi considerada difícil.

13 – Que texto(s) escrito(s) nos últimos dez anos merecia um lugar na história do teatro brasileiro?
Fiquei aflito em criar esse novo cânone!!! Passo.

14 – Qual o texto dramático clássico brasileiro, de qualquer tempo, você recomendaria encenações constantes?
Nelson Rodrigues merece visitas periódicas.

15 – Cite um(a) autor(a) sempre ausente dos cânones que merece seu aplauso?
Não me ocorre. Adoro lidar com os cânones nem que seja para re-configurar suas intenções e lugares de legitimidade.

18 – Que montagem (ou ator, autor, diretor, cenógrafo, figurinista, iluminador) festejado pela crítica você detestou?
Passo.

19 – E que montagem (ou ator, diretor, autor) demolida por críticos você gostou?
Pago.

20 – Qual peça e personagem gostaria de fazer? Você pode escolher três.
Fazer Nijinski no teatro é o fetiche mais próximo.

21 – Que virtude você mais preza no teatro de qualidade?
Que seja passível de ser sempre reformulado, tanto na estrutura da própria encenação como na leitura de quem frui. “Obra definitiva” é cansativa.

22 – O que mais incomoda você no mau teatro?
Comodismo, excesso de reverências a certos paradigmas canônicos, falta de estudo e de relações propositivas com as fontes de criação – seja um texto ou um assunto.