domingo, 16 de junho de 2013

Registro 432: Uma lágrima para Tatiana Belinky




Tatiana Belinky
(1919-2013)

    Desde que cheguei à São Paulo fui me aproximando de Tatiana Belinky, mas não como amigo e sim como admirador. Esta aproximação se deu primeiro pelo fato de trabalhar em um colégio israelita-brasileiro, o Scholem, de boas memórias. Depois, por pertencer à classe teatral. Ao sair da Bahia para ser ator em São Paulo, logo me senti acolhido ao ingressar no elenco de A Perseguição, texto de Timochenko Webbi, sob a direção de Márcio Aurélio. Além disso, tornei-me amigo da minha querida Fanny Abramovich, escritora como Belinky. Estas circunstâncias foram aproximativas.
     Tatiana Belink, judia-russa, escritora, dramaturga, exerceu a crítica teatral destinando seu olhar para o teatro que se fazia para crianças e jovens em São Paulo. Por um bom tempo dirigiu uma coleção de textos de teatro, Cadernos da Juventude, da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. Logo, eu tomei conhecimento das adaptações que fizera dos livros de Monteiro Lobato para a televisão (Tupi), trabalho realizado com seu marido Julio Gouveia, no começo da década de 50. Não vi nenhum dos programas e nem sei se eles foram exibidos na Bahia. Não havia aparelhos de televisão na cidade onde residi e passei uma parte da minha infância, mas desde cedo fui leitor da obra para criança do paulista Monteiro Lobato. Um tempo de descoberta. Depois acompanhei a segunda versão para televisão do Sítio do Pica-pau Amarelo, a primeira e mais bonita e bem adaptada da Globo. Depois virou um mixórdio.
    Fui leitor dos livros de Tatiana Belinky e quando passei a escrever literatura para crianças e jovens, a escritora foi sempre uma iluminação para as minhas dúvida a respeito de temas e formas de abordá-los. Quando me tornei dramaturgo, as minha peças foram criticadas pela escritora, que aos 94 nos deixa. 
      Lembro-me bem do que ela escreveu sobre Brincadeiras e sobre Quem Conta Um Conto Aumenta Um Ponto, quando das estreias em Sampa. Sua opinião calou fundo e serviu para que eu corrigisse os desvios ou então para incentivá-los, já que ela era uma escritora muito livre e transgressora de muitas normas. Um incentivadora, está senhora vivaz, risonha e culta. Esta última qualidade era exibida sem a arrogância do saber, um traço que marca um certo tipo de intelectual que nos ronda, principalmente aqueles que transitam pela Academia.
        Tenho comigo o texto que escreveu sobre o meu primeiro livro Um Muro no Meio do Caminho. A crítica elogiosa apontava as qualidades do texto, o inusitado do tema. Mas ela puxou-me a orelha por eu ter denominado estrangeiros de "cucarachas". O puxão de orelhas foi sentido, tanto que na segunda edição do livro, tratei de suprimir o meu preconceito, pois o que parecia engraçado revelava uma visão desprezível. E olha que não sou politicamente correto o tempo todo. Tatiana estava correta.
      Anos mais tarde, participando de uma seminário sobre literatura destinada crianças e jovens e estando em crise em virtude de não conseguir publicar meus livros, ao queixar-me do desânimo, ela foi direta e objetiva. "Escreva! Continue escrevendo"
     Foi a salvação! Ainda que a salvação esteja tão difícil nos tempos de agora. 
               E como esquecer as traduções que Belinky fez do meu russo preferido Anton Tchekhov. Preferido entre tantos outros. Autora de mais de 200 títulos, escreveu Transplante de Menina - Da Rua dos Navios à Rua Jaguaribe, autobiográfico, Limeriques do Bípede Apaixonado, Coral dos Bichos, A Operação do Tio Onofre, O Grande Rabanete, Aparências Enganam, entre outros divertidos livros.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Registro 431 Um texto que dá o que pensar



PEC 37: um desserviço à nação brasileira

Filipe Leão *

As investigações de crimes contra a administração pública, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal devem ser prerrogativas de órgãos e carreiras, em regime colaborativo. A exclusividade do inquérito policial para persecução penal desses casos, como prevê a PEC 37/2011, só fragiliza a punição de culpados, além de favorecer nulidades processuais nas investigações em curso.

Atualmente, inúmeras investigações estão em andamento no Brasil. De igual modo, outros sem número de inquéritos são abertos diariamente, ficando muitos sem conclusão ou até mesmo prescritos. Isso ocorre porque o dia-a-dia das delegacias (roubos, furtos, lesões corporais, homicídios e tráfico de drogas) já consome todo o aparato e efetivo policial.

Considerando as características sociais do país, a extensão territorial e das fronteiras, a população e o rol de crimes elencados no Código Penal, não é razoável acreditar que somente uma organização (de modo exclusivo) dará cabo de todas investigações – comuns ou especiais.

Por conta da especialização, crimes contra a administração pública, lavagem de dinheiro e sonegação, por exemplo, muitas vezes são detectados por órgãos e carreiras do Estado que lidam diretamente com esses assuntos.

Nesse sentido, órgãos como a Controladoria-Geral da União (CGU), a Receita Federal e o Banco Central, quando detectam indícios de crimes, em geral, produzem relatórios com elementos conclusivos de autoria e materialidade. Embora não sejam considerados “inquéritos policiais”, formalmente, esses documentos respaldam propositura de ações pelos Ministérios Públicos ou aprofundamento das investigações pelas polícias.

Considerando condutas criminosas cada vez mais sofisticadas, é retrocesso atribuir exclusividade nas investigações que respaldam as ações penais, pois o resultado em nada contribui para a sociedade. No limite, as demandas sobre casos de corrupção, lavagem de dinheiro e sonegação podem entrar na vala comum dos inquéritos, abrindo margens inaceitáveis para prescrições e favorecendo a impunidade.

No século XXI, precisamos fortalecer os instrumentos e a colaboração do aparelho de Estado, não o inverso. A burocracia deve reafirmar seu papel indutor do desenvolvimento e não atuar como apenas mais um instrumento de blindagem da corrupção política no país.

*Diretor do Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle da Controladoria-Geral da União (Unacon Sindical) e da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e vice-presidente do Instituto de Fiscalização e Controle (IFC).