quinta-feira, 21 de maio de 2009

Registro 257: Flávio Império

Arquiteto, professor, artista plástico, diretor, produtor e cenógrafo, Flávio Império dedicou sua vida ao fazer teatral, participando de experiências consagradas e inovadoras do teatro brasileiro, como as do Arena e do Oficina, além de contribuir com seu talento para inúmeros espetáculos fora dos dois grupos magistrais.
Pelo seu trabalho recebeu quase vinte prêmios, como o Governador do Estado, Saci, Molière, Associação Paulista de Críticos de Arte, Medalha de Ouro na Bienal de Teatro e Prêmio de Cenografia na Quadrienal de Praga.
Flávio Império amadureceu como artista que entende a estrutura da linguagem teatral como totalidade. Para ele, cenografia não é fundo e roupa. É muito mais. É o momento do acontecimento teatral, incluindo a ação dramática, texto, luz, som, movimento e o público.
Conheci Flávio em 1976 depois que ele retornou de um verão na Bahia. Hóspede de José Possi Neto na Boca do Rio, Flávio soube por Possi da minha pessoa: uma jovem ator residindo em São Paulo, em começo de carreira. Certo dia, o porteiro do edifício anunciou a sua chegada para uma visita. E eu que admirava seus trabalhos, mas não o conhecia pessoalmente, tratei de recebê-lo ainda sob o impacto da surpresa.
Ao abrir a porta percebi de cara a força da presença. Sem muitos rodeios ele entrou sorrindo abertamente e com uma certa ironia disse estar ali para conhecer um ator baiano de quem tinha ouvido falar muito. Encabulei.
Ele relatou a estada em Salvador. Contou sobre a praia da Boca do Rio, sobre o Carnaval e sobre a perda da carteira surrupiada em meio a folia. De cara, me deu uma de suas gravuras impressa em acetato. No centro da gravura a imagem de um homem, que depois vim a saber quem era. Um homem nu em meio as formas orgânicas, destacando-se uma frase escrita numa espiral. Não lembro do texto; a gravura se perdeu entre as arribações. Mas a frase inicial dizia: "Tens algo das plantas, tens algo dos animais..." A partir daí tornei-me amigo e admirador desse artista, para quem Gianni Ratto dedicou o seu livro Antitratado de Cenografia. Em um país de significativos cenógrafos, Ratto também um importante artista da cenografia escolheu Flávio e Tomás Santa Rosa para homenageá-los. Transcrevo um trecho do livro:
É inevitável, observando panoramicamente a obra de Flávio, pensar nos grandes artífices da Renascença: homens-artistas-artesãos que dominavam um leque de atividades complexas cuja dimensão era a resultante de um esplêndido instinto criador aliado a uma intuitiva postura crítica (RATTO, 2001, p. 17).
Muito se escreveu sobre Flávio e ele deixou muitos escritos ainda sem publicação, mas um livro fundamental foi publicado pela Edusp: Flávio Império, organizado por Renina Kataz e Amélia Hamburguer.
Os textos e as reproduções dos quadros que se seguem são de autoria do cenógrafo inventor.
O teatro me ensinou a vida;
A arquitetura o espaço.
O ensino sinceridade.
A pintura a solidão.
O teatro me fez amigo da multidão.

Auto-retrato/detalhe.Técnica mista. Coleção particular. 1976

adoro
irmã/mente
noel e shakespeare, boal, zé celso, ruth, sábato; gente que faz acontecer o teatro no Brasil. caetano, bethania, célia, célia helena, cacilda, walmor, andré - sei lá
gente que sempre gostou de atuar na cena. mesmo que não soubessem exatamente o que estavam fazendo
GOSTAM e GOSTAVAM
quem se enche o saco se afasta e é sempre pouco, o que consegue nos afastar.
o comodismo, o dinheiro, a idade, a preguiça, - outras bossas.
uma certa "bohemia", cada geração no seu botequim - bar - restaurante, ou própria casa - vendo televisão.
e todo mundo hoje em dia claro que prefere receber em dollares, como a Carmem Miranda!
o "artista" precisa de muita conversa tanto quanto de muito silêncio e recolhimento interior pra conseguir criar.
só na correria, não dá!
e sossego é dólar, ou relativa pobreza.
agradeço a todos os que até hoje me aplaudiram.
porque GOSTARAM.
e se gostam eu também fico contente de conseguir "fazer" o próprio "ato" de agradar.
"gostar da gente" é o nosso IBOPE pessoal
não tenho unanimidade. (mas isso, nem Cristo) mas uma deliciosa platéia,
quando é Bethania, Gal, Artigas, Caetano, Walmor, Célia, Edmar, Gláucia, Vina, Azzis, Guarnieri, Paulo José, Tozzi, Carmela, Djalma, Dina, Myriam, Flávio Motta, Renina, Parreiras, e quantos foram os aplausos.
tive de "agradecer" na estréia de Andorra. fui levado pelo próprio chamado
foi incrível
e, basta uma vez na vida.
é uma enorme prova de amor alegre e cheio de lágrimas foi tão grande o sentimento, que até hoje agradeço.
se me perguntassem algum desses dias com quem mais gostaria de trabalhar
eu reponderia ARRIGO e CASÉ
há sempre com quem, imagine ter feito a "cenografia" de algum show da Ângela Maria, Procópio, Dulcina, e do próprio Noel ao vivo.
seria um total barato!
ter feito Doces Bárbaros, pra mim foi "diploma PHD". tive uma semana pra bolar, fazer, levar, pendurar e ficar olhando, PASMO! tinha conseguido.
em particular, agradeço à Sonia minha "fada madrinha" .
e ao Iácov que, pela 1a. vez, "iluminou" um espetáculo em que a cenografia nasceu junto: OTHELLO.
e ao Arquimedes, por ter me ensinado tudo sobre "o palco", e ainda me ensinar, e aos meus "alunos" que me obrigam a "sambar", e manter o ritmo de cintura.
necessário ao "passar do tempo"
assim, enfim, agradeço a Deus por existir.


maio 1983

Gerais/detalhe. Técnica mista, 1977

Sinto sempre o impulso que eu pinto
sintonizo e pinto
esse impulso me livra
me liberta me diverte me alerta
que amanhã haverá sol
mesmo que hoje eu morra
o outro dia é renascer do seu ser do sol
da chave maior que é a libertação da dor,
o amor
Refazendo.Técnica mista, coleção particular,1975


Bananeiras

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